|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
RUY CASTRO
Impróprio para menores
RIO DE JANEIRO - Uma vez tiete, sempre tiete. Sou leitor de Carlos Heitor Cony há tanto tempo que
às vezes me pergunto se não saltei
direto da cartilha para seus livros.
Não foi assim, mas quase. Comecei
a ler Cony em 1961, quando ele surgiu no "Correio da Manhã", do Rio,
escrevendo dia sim, dia não, uma
crônica genericamente intitulada
"Da Arte de Falar Mal". Era um permanente e implacável exercício de
niilismo, tão hilariante quanto sedutor e, quem sabe, impróprio para
menores -como eu, que tinha 13
anos e me identifiquei para sempre
com esse traço de Cony.
Não muito depois, também fui
parar na imprensa e fiquei seu amigo. Calhou que, em 1969, ele fosse
meu editor numa revista e, em
1970, eu fosse editor dele, em outra.
Mas o maior período em que trabalhamos juntos foi na redação de
"Manchete", em mesas contíguas,
entre 1970 e 1973. Depois, cada qual
seguiu seu caminho, mas nunca sumimos um do outro por muito tempo, ligados por várias fixações em
comum.
Uma delas é a de que somos os
únicos membros do informal fã-clube carioca de Nacio Herb Brown,
o compositor de "Cantando na
Chuva". Outra é a admiração por
Ary Barroso, Otto Maria Carpeaux,
Mario Filho e pelas coxas de Silvana
Mangano em "Arroz Amargo". E
ainda outra é a facilidade para rir de
nós mesmos, principalmente quando trocamos confidências, verídicas
ou imaginárias. Mas chegará o dia
em que, em vez de confidências,
trocaremos sintomas.
Até hoje guardo os "Da Arte de
Falar Mal" originais, tirados do
"Correio". São recortes de mais de
40 anos e, incrível, sem aquelas
manchas amarelas. A prosa de Cony
também continua enxuta, indistinguível do material que ele produz
há anos para a Folha. Revezar com
ele neste espaço não será apenas
uma honra, mas uma parada.
Texto Anterior: Brasília - Melchiades Filho: Divisão intermediária Próximo Texto: Antonio Delfim Netto: Esquerda e direita Índice
|