São Paulo, Segunda-feira, 28 de Junho de 1999
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A roda da história

CARLOS HEITOR CONY
Rio de Janeiro - Apesar da desleal concorrência do Clóvis Rossi, que veio especialmente ao Rio para cobrir essa tal de Cimeira, meto minha colher nesse complicado angu.
Em primeiro lugar, estou me sentindo importante pra burro. O Clóvis só vai a lugar onde as coisas estão fervendo. O fato de estar aqui, e não em Kosovo, Davos -nesses lugares onde os grandes do mundo se reúnem com ele-, dá fumos de fidalguia universal a qualquer carioca do Lins de Vasconcelos, do bulevar 28 de Setembro.
Como sempre, eu estava por fora da reunião e nem sabia ao certo para que tanta gente se reunia. Dei uma olhada nos jornais e fiquei desconfiado. A pauta é inacessível a um ignorante como eu. Mas não deixa de ser a primeira tentativa articulada de uma reação mundial contra a hegemonia econômica, política, militar e cultural dos Estados Unidos.
Os blocos aqui reunidos incluem Europa, Caribe e América Latina -ou seja, aquilo que chamamos de Ocidente, sem o maior parceiro comercial do planeta Terra nesta virada de milênio.
Equivaleria a uma reunião da Trácia, Cirinéia, Dalmácia, Macedônia, Capadócia e Éfeso para formarem um bloco que, direta ou indiretamente, tentaria criar um modus vivendi sem necessidade de Roma. Isso no tempo em que uma legião romana, mesmo sem ser comandada por Marlon Brando ou Kirk Douglas, funcionava melhor do que as tropas da Otan de hoje.
Vale a intenção. Por coincidência, pouco antes da Cimeira houve o caso da Coca-Cola proibida durante alguns dias em países da Europa. Tímido ensaio para ver como as coisas poderiam ficar. Sendo o principal comprador e o principal vendedor de quase toda a produção mundial, os Estados Unidos podem parecer o gigante Gulliver amarrado por pigmeus.
Não sei não. Pretendo ouvir o Clóvis Rossi pessoalmente para saber se a roda da história está iniciando, devagarinho, aqui mesmo no Aterro, um novo ciclo e fechando outro.


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