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O punhal e o antraz
CLÓVIS ROSSI
MADRI - O novo ataque ao Brasil de Domingo Cavallo, o destemperado
ministro argentino da Economia,
equivale a uma punhalada pelas costas no parceiro.
Obrigou o governo brasileiro a chamar de volta o seu negociador-chefe,
o embaixador Botafogo Gonçalves,
num gesto quase equivalente a retirar temporariamente o embaixador
de um dado país, para expressar desagrado com alguma atitude.
Afinal, Botafogo não é um embaixador qualquer, mas o representante
do presidente da República para assuntos do Mercosul. Na prática, significa que as relações com o vizinho e
parceiro estão congeladas.
A punhalada pelas costas se dá pelo
fato de que amanhã, em Bruxelas, está previsto o reinício das negociações
entre o Mercosul e a União Européia,
em busca da constituição de uma zona de livre comércio entre os dois blocos.
Três dias antes do novo incidente,
Fernando Henrique dissera, na OAB,
que havia no Brasil a percepção de
que o acordo com a Europa era mais
favorável do que o entendimento
com os Estados Unidos em torno da
Alca (Área de Livre Comércio das
Américas).
Que credibilidade pode ter qualquer negociação com um bloco cujos
dois principais componentes estão
em clara rota de colisão?
Fica até tentador dizer "bem feito"
para o governo brasileiro. Foi um erro aceitar negociar salvaguardas, como querem os argentinos, para proteger setores econômicos locais da
contínua desvalorização do real. Afinal, o Mercosul foi feito para facilitar
o livre comércio. Salvaguardas atrapalham, não facilitam.
Teria sido mais honesto e até mais
piedoso dizer aos argentinos que o
seu modelo cambial é insustentável,
como, de resto, já o fez o secretário
norte-americano do Tesouro, Paul
O"Neill.
O Brasil não tem por que pagar,
ainda que parcialmente, o custo do
tratamento do filho de Cavallo (o
câmbio fixo), depois que este contraiu antraz pulmonar e está sufocando a economia argentina.
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