São Paulo, domingo, 28 de outubro de 2001

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Sabonetes e candidatos

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Nada tenho contra ou a favor dos marqueteiros. São necessários para convencer as massas, obrigando-as a usar um sabonete, uma pasta dental, frequentar um restaurante e morar num condomínio fechado.
Longe de mim desejar-lhes mal, discutindo seus conselhos e esnobando suas sugestões.
Acontece que, além de sabonetes e dentifrícios, de uns tempos para cá eles têm lançado no mercado um produto estranhíssimo, em forma de candidato presidencial.
Nada tenho também contra os sabonetes, os dentifrícios. Tampouco tenho algo contra os candidatos presidenciais. São filhos de Deus ou do diabo, como todos nós.
Produzir um deles com os mesmos ingredientes com que se produz a campanha de publicidade de um sabonete ou de um dentifrício é um desafio técnico, que os marqueteiros procuram vencer.
Não é por aí que nasce a minha estranheza. O diferencial entre o sabonete/dentifrício e o candidato presidencial é que os sabonetes/dentifrícios são o que são, com tais e tais qualidades, desde o perfume, a eficácia e o preço.
Já os candidatos presidenciais, produzidos pelos marqueteiros, são obrigados a mudar de perfume, a exagerar a eficácia e a aumentar o preço que será oferecido ao consumidor.
Fiquemos no perfume dos sabonetes. Antigamente, a indústria vendia perfumes que todos identificávamos: rosa, sândalo, cravo, violeta, jasmim, alfazema etc. Mais tarde, os químicos bolaram outras essências e os marqueteiros definiram esses perfumes com conceitos abstratos: cheiro de emoção, perfídia, sedução, intriga, entrega.
Na deformação profissional da classe, os candidatos presidenciais, que antes eram isso ou aquilo, estão se transformando em abstrações, como os sabonetes e dentifrícios.
PS) O cronista entra em férias e sai de circulação.



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