São Paulo, segunda-feira, 28 de outubro de 2002

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VINICIUS TORRES FREIRE

José Serra

SÃO PAULO - Não é pouco para um país como o Brasil ter disposto de duas boas candidaturas a presidente -um país tão reacionário e ignorante, do povo sem instrução à elite, na maioria tão ignara de bom gosto, conhecimentos e civilização. Os finalistas eram tão bons que a gente até fica tentada a imaginar que o país vai mudar mesmo. Mas líderes políticos são apenas parte da história.
É exagero dizer que Serra perdeu a eleição devido a suas qualidades, o que é negado por desafetos medíocres. De resto, Serra e equipe estavam mais prontos para governar; o PT, enfim, só deixou de lado o besteirol econômico anteontem.
Serra perdeu por ser o candidato de um governo que mais nada tinha a oferecer após o fim da inflação, a mentira do real forte, o racionamento. De um governo que cansou.
Mas o tucano de esquerda perdeu apoio entre seus pares e a eleição da "brasilidade". Manemolência, emocionalismo, carnavalização e populismo e Serra não combinam. Ele exagera, certo. Parece autoritário. É arrogante, diz gente menor (arrogância se enfrenta dobrando a aposta do arrogante, não com choramingo).
Uma vez estive com Serra no Ministério da Saúde. Vi gente trazer, meio trêmula, papéis para o "senhor ministro". Pensei que eram contínuos assustados. Eram burocratas assustados com exigências obsessivas de Serra. O Brasil não é muito acostumado a racionalidade, eficiência. O Brasil ainda é muito devagar e sempre.
Serra não é lá muito jeitoso. Vi em 1996 os sorrisos-muxoxos que distribuía na campanha para prefeito. No final de uma entrevista, no Natal de 2001, disse-lhe que a economia e a sua cintura dura iriam derrotá-lo. Retrucou que não mudaria.
Serra foi um dos primeiros a fazer um governo prudente nas finanças, na gestão de Franco Montoro em São Paulo. É um economista capaz, que pensa os problemas nacionais com a própria cabeça, não com ortodoxias de cartilha. É algo inábil e megalomaníaco. Mas é uma das melhores figuras públicas do país.


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