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CARLOS HEITOR CONY
Para mais ou para menos
RIO DE JANEIRO - Para mais ou para menos, para o bem ou para o mal,
Lula chegou finalmente lá. Antes de
mais nada, registre-se o óbvio: pela
primeira vez, um ex-operário chega
ao poder sem necessidade de uma revolução, de uma profunda alteração
no sistema institucional de um país.
Nem Marx, nem Lênin poderiam
prever isso, uma vez que pensavam
em classes, e não em indivíduos.
Até que ponto o ex-metalúrgico
mudou, não de grau, mas de gênero,
deixando de ser povão para ser cartola, o futuro imediato dirá. Karol
Wojtyla foi operário numa Polônia
oprimida inicialmente pelo nazismo,
depois pelo comunismo, chegou a papa, mas se tornou João Paulo 2º.
Registre-se também o lado positivo
deste episódio eleitoral. Não há no
horizonte presumível nenhuma
ameaça de golpe ou de casuísmo. A
pressão externa, que se tornou explícita ao longo da campanha, tanto na
alta do dólar como nos desabafos de
alguns megaespeculadores, não alterou a vontade nacional, que desejou
colocar no poder um não-bacharel,
um homem de língua presa e gramática solta.
Não votei nele nem em Serra. Não
votei em nenhum dos candidatos
presidenciáveis. Mas, passada a poeira, reconheço que os quatro que disputaram o primeiro turno, e principalmente os dois que foram ao segundo, apesar de um ou outro arranhão no percurso, portaram-se com
absoluta dignidade.
Mesmo assim, há de se admitir a
margem aberta para o medo. Não
para o medo de Lula, que é um bom
sujeito, mas dos aproveitadores de
sempre, que rondaram o eleito com
aquilo que o finado Jânio Quadros
chamava de "apetites".
Não pelo apetite das negociatas,
mas pelo apetite da desforra. É evidente que nenhum governo, nem
mesmo o de Lula, será imune às investidas ao erário público. Teme-se
que, em nome da pureza ideológica
que lubrificou a máquina do PT lá
atrás, o próprio Lula seja incapaz de
deter as cobranças que certamente
virão.
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