São Paulo, sábado, 29 de julho de 2006

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LUIZ FERNANDO VIANNA

Cheiro de morte

RIO DE JANEIRO - Anthony Garotinho declarou anteontem seu voto em Heloísa Helena. Não é provável que a senadora vá agradecer comovida esse abraço de cascavel, mas, se estiver pensando em fazê-lo, convém antes visitar Campos.
Por seis anos, Garotinho foi prefeito da cidade do norte fluminense: 1989-92 e 1997-98. Somando-se aos quatro em que foi governador (1999-2002) e aos quatro de sua mulher, Rosinha Matheus (2003-2006), são 14 anos em que ele poderia ter melhorado a vida na cidade.
A morte de quatro crianças entre 24 de maio e 5 de julho levou a imprensa a dar uma olhada em Parque Santa Rosa, bairro da periferia de Campos. Os irmãos Carollainny, sete meses, e José Vítor, quatro anos, eram vizinhos dos irmãos Jefferson, 8, e André Luís, 4, na rua Soldado Salvador Rosa.
O que atraiu a imprensa foi a falta de explicação para as mortes. De Carollainny, acredita-se em diabetes. Dos outros, ainda estão sendo feitos exames. Eles só tiveram febre baixa e sonolência antes de apagar de repente.
Não se sabe a causa médica, mas a social é gritante. As casas não têm água encanada nem saneamento básico. Em vez de vasos sanitários, fossas. Os donos do pedaço são os ratos. "Eles parecem gatos, de tão grandes", diz Soraya Oliveira, 32, mãe de Jefferson e André.
Na rua sem pavimentação, uma das diversões das crianças é brincar em um terreno baldio. Pouco depois da quarta morte, uma escavadeira da prefeitura fez uma limpeza fajuta no local. A máquina passava, os ratos pulavam.
Todos os políticos que mantêm Parque Santa Rosa em um estágio medieval são culpados pelas mortes das crianças. Se Garotinho não pode ser responsabilizado criminalmente, pelo menos devia se mancar e deixar a vida pública. Seus abraços podem matar.


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