São Paulo, segunda-feira, 29 de setembro de 2008

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RUY CASTRO

0,0001% de royalties

RIO DE JANEIRO - Morreu na semana passada, em Los Angeles, um baterista chamado Earl Palmer. Tinha 84 anos e era considerado o inventor da batida do rock and roll na bateria. Quando se escutam as gravações originais de "Tutti Frutti" ou "Good Golly, Miss Molly", com Little Richard, e "The Fat Man" e "I'm Ready", com Fats Domino, todas dos anos 50, a bateria é ele.
Palmer inventou a batida do rock and roll, veja bem, não o infame pancadão ou bate-estaca a que ela seria reduzida no futuro. Na verdade, apenas adaptou o "back beat" -em que, no compasso 4/4, o primeiro e o terceiro tempos são fortes e o segundo e o quarto, fracos- àquela variação de rhythm and blues que se cozinhava em sua cidade, Nova Orleans.
Se foi uma adaptação ou uma criação original, não importa. O fato é que foi Palmer. Se os bateristas recebessem 0,0001% de royalties toda vez que um músico usasse um ritmo ou batida criado por eles, haveria menos bateras pobres no mundo. Palmer nunca recebeu esses royalties e passou a vida trabalhando. Por sorte, seus patrões eram Frank Sinatra, Ray Charles, Dizzy Gillespie, B. B. King.
Outro baterista, Kenny Clarke, inventou a batida do be bop. Em 1942, ele libertou as peças da bateria, tornando-as entidades independentes. Também não fez jus a royalties nem ficou rico, mas, pelo menos, passou seus últimos 30 anos de vida em Paris.
Ninguém mais injustiçado, no entanto, do que o nosso Milton Banana. Em 1957, ao lado de João Gilberto, ele criou nada menos que a batida da bossa nova na bateria. Morreu em 1999, aos 64 anos, sem tostão, com uma perna recém-amputada, e ainda teria sido pior se não fossem os amigos. Com Banana, 0,0000001% de royalties bastariam para que vivesse cem anos sem nunca pensar em dinheiro.


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