São Paulo, quarta-feira, 29 de outubro de 2003 |
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FERNANDO DE BARROS E SILVA Socialismo ajustado
SÃO PAULO - Bíblia da banca internacional, o "Financial Times" publicou anteontem editorial cumprimentando Lula -não pelos 58 anos completados naquele dia, mas pelo êxito
da política econômica no combate à
inflação. Premiado o arrocho, os porta-vozes do mercado cobram do bom
aluno que conclua a lição de casa do
ajuste, levando a cabo as reformas.
Enquanto isso, cá embaixo, Lula
soprava suas velinhas durante o congresso da Internacional Socialista. E
alertava para as ameaças à soberania do país diante da mundialização.
Néstor Kirchner, que fala menos, tem
feito mais pela vizinha Argentina.
A retórica terceiro-mundista e confusamente esquerdista do presidente
-alçado à condição de novo líder
mundial de uma esperança-fantasma, porque vazia- contrasta com a
realpolitik petista, que vai no sentido
contrário. Até nisso, na distância que
abre entre suas palavras e seus atos,
Lula lembra FHC -um sentimental,
outro mais racional, ambos mestres
na arte de seduzir platéias com seu
reformismo social moreno -aquele
que é sem nunca ter sido.
Da esquerda, o governo parece reter apenas os cacoetes: o centralismo
(pouco) democrático, a máquina de
propaganda, o aparelhamento do
Estado, os serviços de inteligência (e
outros, menos ortodoxos) resvalando
perigosamente para uma mentalidade refratária à vida democrática.
Soma-se a esses traços, que distinguem os novos inquilinos do poder, a
tolerância com os pecadilhos da cultura política fisiológica, que os nivela
a seus críticos, todos cínicos. O caso
Benedita fala por si. O lulismo vai assim, um ano depois de eleito, se ajustando ao processo político brasileiro.
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