São Paulo, terça-feira, 30 de agosto de 2005

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MÉDICO-PROPAGANDA

A relação promíscua entre médicos e laboratórios já levantou tantas polêmicas que até burocracias tradicionalmente lentas como a do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já baixaram, em 2000, resoluções para disciplinar a matéria. As normas representaram um avanço, mas estão longe de ter solucionado a questão.
Como mostrou reportagem publicada ontem por esta Folha, laboratórios continuam assediando profissionais da saúde e transformando médicos em garotos-propaganda. Fazem-no das mais variadas formas, que vão da oferta de brindes ao pagamento de viagens para congressos. Se as fronteiras entre o que é propaganda legítima e o que configura infração ética já são difíceis de definir, mais complexo é regulamentar a matéria. Implementar de fato as regras, então, torna-se quase uma quimera.
Como se não bastasse, laboratórios são também acusados de tentar manipular a pauta de eventos científicos em favor de seus produtos e de esconder da comunidade acadêmica resultados de testes desfavoráveis.
Reconheça-se que a indústria investe grandes somas para pesquisar e desenvolver um produto, que, muitas vezes, já na fase final de testes, se revela problemático -ocasionando a perda dos recursos aplicados. O laboratório precisa, assim, extrair o maior proveito comercial possível das drogas que chegam ao mercado. É justamente aí que reside o perigo. Mesmo quando o novo fármaco não é tão revolucionário, o laboratório, para reaver o investimento, tenta mostrar o contrário, valendo-se de técnicas normais de propaganda, da sedução direta ao médico e da manipulação de evidências científicas.
Claro que não se pode -nem se deve- negar à indústria o direito de relacionar-se com médicos. É preciso, porém, que esse relacionamento seja melhor acompanhado pelas instâncias responsáveis de modo a fazer valer os limites dentro dos quais ele pode transcorrer legitimamente.


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