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Solidariedade mecânica
"POLÍTICA a gente faz com
o que tem, não com o
que quer", pontificou
anteontem o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva em reunião
com intelectuais na capital paulista. O aforismo -que dá asas à
intrigante especulação em torno
de como seria o governo dos sonhos do petista- surtiu efeito:
um manifesto em apoio à sua
reeleição encerrou a reunião.
Com 213 assinaturas, o documento é o ápice de uma movimentação em voga nas últimas
semanas: a quebra do silêncio de
entusiastas do governo que se
mantiveram à sombra durante
os momentos agudos da crise.
Mal as pesquisas de intenção
de voto registraram o favoritismo do candidato Lula, artistas e
intelectuais aproveitaram jantares, simpósios e celebrações para
voltar aos holofotes e destilar
máximas destinadas a transformar o mensalão em nota de pé de
página da história. Não faltou o
brado contra o "preconceito de
classe" dos que ousam criticar a
administração petista -a mesma que proporciona os mais vultosos lucros aos bancos.
Só não se pode dizer de tamanho entusiasmo que já se dê à luz
do sol -"o melhor desinfetante",
diz um outro aforismo- porque
os encontros com artistas e intelectuais foram todos noturnos.
Os eventos são sobretudo simbólicos. Contribuem para a tentativa de anistiar o presidente dos
escândalos de corrupção; tentam
manter, no plano do marketing,
o vínculo do ex-operário com
frações ditas esclarecidas.
Ainda que demonstrar simpatia ao governo não seja má estratégia para artistas dependentes
de leis de incentivo à cultura, o
apoio sugere ainda outras razões.
Muitas dessas manifestações
ecoam ressentimentos, expectativas frustradas e sobretudo lealdade a um ideário perdido.
Hábil, o presidente Lula nada
perde em alimentar os que insistem em idealizá-lo.
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