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CARLOS HEITOR CONY
Bola demais
RIO DE JANEIRO - Tempo houve
em que um cronista sem assunto
era mais ou menos obrigatório, foi
talvez a era de ouro do gênero. O cara abria a janela, olhava o mundo e a
vida, sentava à máquina e escrevia
sobre o nada, a falta de assunto.
Eram mestres nessa nobilíssima arte. Hoje, com a inflação de assuntos,
as crônicas já não se fazem como
antigamente.
A introdução não é para lavar a vil
testada do autor destas mal traçadas. Na verdade, fica difícil escolher
um assunto quando a área está embolada, todo mundo chutando todo
mundo, nem se sabe onde está a bola, nem mesmo se há bola em campo. Desconfio que, há muito, o jogo
a que assisto, como testemunha, vítima e cúmplice, é uma partida idiota, pois há adversários, campo, juízes, bandeirinhas, balizas, laterais,
redes, regras, platéia, mas falta o essencial, a bola. Vamos na onda, englobando tudo na geléia que a vida e
o mundo nos servem.
Torço pelo Brasil, avante companheiros, ao tremular do nosso pendão, que, com o perdão da palavra,
foi bravamente defendido pelo
Glauber Rocha, há tempos, em Veneza. Nunca me importei com os
filmes dele, ele é mais importante
do que a sua obra. Com a intuição
demoníaca do cangaceiro, a ingenuidade gostosa do caboclo, naquele distante ano, Glauber disse grandes verdades em Veneza: que não
há mais lutas de classe, capitalismo
contra socialismo, ideologia contra
ideologia. A luta é apenas entre o
mundo rico e o pobre. Taí. Concordo. Neste jogo, também, está faltando a bola, ou há bola demais.
Se vivo fosse, Glauber clamaria
mais uma vez contra o conflito entre pobres e ricos, dando como
exemplo mais recente a vitória de
Lula sobre Alckmin. Mais da metade do povo brasileiro vive na pobreza e não tomou conhecimento da
corrupção do governo Lula, de suas
falhas administrativas e éticas.
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