São Paulo, quinta-feira, 30 de dezembro de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

Auto-estima "do" brasileiro

BRASÍLIA - Lula aproveita o final do ano para discorrer sobre auto-estima, afeto, família, orgulho nacional e fracassomaníacos. Tudo, em resumo, para falar "ao coração das pessoas". Ou ao voto do eleitor.
Com seus discursos e entrevistas, ele ocupa longos minutos de TV e de rádio e páginas inteiras de jornais. Antecipa, assim, o clima de palanque e propaganda que se espera em 2005, véspera das eleições presidenciais.
Note-se sobretudo a campanha pela auto-estima que o ministro Gushiken bolou e está encomendando a agências e publicitários. Como se o problema dos brasileiros não fosse desemprego, miséria, violência e falta de moradia, mas, sim, falta de vocação para ser feliz. Baixa auto-estima.
Italianos, espanhóis, portugueses e franceses, para ficar entre os europeus, acham justamente o contrário: não entendem como é que os brasileiros vivem em poleiros nos grandes centros, pedem esmola nas ruas, vestem-se com molambos e estão sempre sorrindo (sem dentes!). Apesar de tudo, fazem Carnaval, rebolam, são bonitos, sensuais e cheios de lero-lero.
Lá, na Europa, eles acham que o brasileiro é um pobre feliz. Aqui, o presidente vê o brasileiro como um sortudo que só reclama do lado ruim das coisas. Questão de ótica. Uma é do turista. A outra é do candidato.
Se alguém chega ao fim de 2004 com boas razões para estar com a auto-estima lá em cima, não é o zé-povinho, mas, sim, o próprio Lula. Passou o ano apanhando por causa da política econômica e da má gerência na área social, perdeu colaboradores importantes e simbólicos, levou um tranco no segundo turno das eleições municipais. Mas sua aprovação cresceu dez pontos em quatro meses e bate em 45% segundo o Datafolha.
A economia dá bons sinais, o presidente vai bem e o candidato à reeleição parece ótimo. Com uma freada nos juros e uma campanha maciça de afeto, amor, orgulho e felicidade, Lula entra 2005 com tudo. As condições do brasileiro podem não estar lá essas coisas, mas a auto-estima do presidente está uma maravilha.

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