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Loucuras do milênio
CARLOS HEITOR CONY
Rio de Janeiro - Nunca me entusiasmei pelas retrospectivas. Acho que foram inventadas pelos editores de segundos cadernos para compensar a
falta de assunto dos finais de ano,
quando todos estão em outra, e a taxa
de leitura dos jornais e revistas diminui.
Evidente que também apelei para o
recurso, ao tempo em que fui editor. Ia
esquecendo: salas de cinema sem público também fazem retrospectivas em
que são exibidos sempre os mesmos
filmes.
Bem, numa crônica de fim-de-ano,
seria natural que eu também fizesse
minha retrospectiva particular. Mas
não o farei. Contudo confesso que já
estou salivando por conta da grande
retrospectiva do século, ano que vem.
Sem falar na retrospectiva do milênio,
essa sim vai dar briga de foice nos círculos especializados.
Quem será o homem do milênio?
Nas escaramuças preliminares já falaram em são Francisco de Assis, Napoleão, Carlos Magno, Lutero e Colombo. Estranhamente, ninguém ainda
falou em Tom Jobim ou em Fernanda
Montenegro, que, apesar de mulher,
mereceria uma citação obrigatória.
Confesso que não estou disposto a
perder o que me resta de tempo para
fazer a minha lista do ano, do século e
muito menos do milênio. Pode parecer
ignorância de minha parte -e o é
com certeza-, mas não me identifico
com este século que está acabando.
Muito menos com o milênio.
Há tempos, o Ruy Castro fez um livro sobre os mitos do século 20 e quis
saber minha opinião a respeito. Parodiei Groucho Marx e disse que não
posso levar a sério o século em que vivo.
O mesmo poderia dizer a propósito
do milênio. Não posso falar pelos outros, por todos os que nasceram e viveram nestes mil anos de história humana. Falo por mim mesmo. Olho-me no
espelho -é o bastante para ficar sabendo que o milênio não prestou mesmo. Se prestasse, ou teria me feito melhor ou simplesmente não permitiria
que eu existisse.
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