São Paulo, quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

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PLÍNIO FRAGA

Trava-língua petista

RIO DE JANEIRO - O linguajar eufemístico é característica da tecnoburocracia. Na era tucana, flexibilizar foi a palavra da moda. Era usada para suavizar a quebra de monopólios, a revisão de direitos trabalhistas, a maleabilidade nas obrigatoriedades estabelecidas em lei. Foi a partir daí que o José Simão iniciou sua campanha pela erradicação do tucanês.
Em todos os textos de todas as edições da Folha em 1994, o verbo flexibilizar apareceu apenas 66 vezes. No ano seguinte, o primeiro da administração FHC, a freqüência do uso do verbo saltou para 155.
Em si, a flexibilização não é necessariamente boa ou ruim. Mas, quando se torna um ardil para justificar atos de governo -os justificáveis também, mas os injustificáveis principalmente -, a muleta tecnoburocrática é alçada a totem.
A moda do lulês -a contraposição óbvia ao tucanês na sacada de Simão- agora é destravar. Anteontem, Lula usou o termo de novo: "Uma coisa importante [do PAC] são as mudanças legislativas, que é para tentar destravar o país", disse.
No primeiro ano da administração Lula, o verbo destravar apareceu na Folha parcas 16 vezes. No ano passado, a freqüência do verbo saltou para 147 (já flexibilizar caiu para 66). Desde março de 2004, "destravar" esteve presente 31 vezes nas falas de Lula.
A língua é reflexo dos tempos. O país trocou o flexibilizar tucano pelo destravar petista. Ambos são muletas da falta de estilo, dribles lingüísticos, espertezas de discursos preguiçosos e pouco sinceros.
Um dos trava-línguas famosos é o roubaram a roupa do rei de Roma. No destrava-língua petista, os aloprados roubam a roupa do rei, que diz não saber de nada, nem mesmo se está nu. No país da piada pronta do Simão, o presidente que pretende destravar o Brasil tem a língua presa, e os aloprados estão à solta.


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