São Paulo, sexta-feira, 31 de março de 2006

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UM BRASILEIRO EM ÓRBITA

A viagem do tenente-coronel Marcos Cesar Pontes ao espaço serve a dois propósitos. Permite que o governo diga que colocou um brasileiro no espaço -o que não é bom nem mau- e ajuda a encobrir o fiasco que foi e ainda é a participação do Brasil na Estação Espacial Internacional (ISS) -o que é péssimo.
A novela da ISS começou no governo Fernando Henrique Cardoso. Pelo acordo inicial, firmado com a Nasa, a agência espacial norte-americana, o Brasil fabricaria peças para a estação, orçadas em US$ 120 milhões, e figuraria como uma das 16 nações construtoras da ISS, além de conquistar o direito de fazer duas viagens espaciais e alguns experimentos científicos. Era um projeto megalomaníaco desde a origem.
O Brasil, porém, nunca entregou as peças prometidas. Vinha sendo pressionado pela Nasa. Mas, depois da explosão do ônibus espacial Columbia, em 2003, o cronograma se desintegrou. O atraso deixou de ser importante, e o vôo do astronauta brasileiro ficou para as calendas.
Para não perder anos de treinamento de Pontes e ter a chance de dizer "pela primeira vez na história deste país mandamos um homem ao espaço", o governo Lula teve que se entender com os russos. O Brasil está pagando cerca de US$ 10 milhões, quando o valor "de mercado" de uma viagem a bordo da Soyuz é de US$ 20 milhões. Moscou concedeu esse desconto porque pretende transformar o Brasil em cliente de sua tecnologia espacial.
A aventura brasileira pode produzir vantagens intangíveis, como despertar o interesse de jovens pela ciência e até mesmo facilitar a "venda" da base espacial de Alcântara (MA) a países interessados em lançar foguetes a baixo custo. Dependendo do valor que se atribua a esses eventuais benefícios, os US$ 10 milhões podem ser considerados um preço razoável. Só o que não dá é para tentar esconder atrás do factóide do astronauta brasileiro o fracasso que foi a participação do país na ISS.


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