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TENDÊNCIAS/DEBATES
É positiva a decisão do TSE que estabelece
ser do partido o mandato de deputado?
SIM
Mais um passo na direção correta
ROGÉRIO SCHMITT
NÃO PRETENDO debater o mérito jurídico ou constitucional
da recente interpretação feita
pelo TSE de que os mandatos dos deputados e vereadores pertencem aos
partidos pelos quais foram eleitos, e
não aos parlamentares. Também não
sou capaz de avaliar se decisões judiciais dessa magnitude caracterizam
uma indevida intromissão do Judiciário sobre as prerrogativas do Legislativo ou se contribuem para gerar insegurança jurídica no país.
Mas não resta dúvida de que a decisão do TSE pode ser considerada um
passo na direção correta. Ela cria um
forte incentivo para a redução do troca-troca partidário, que é uma das
mais graves distorções do sistema político brasileiro.
A propósito, a avaliação do TSE de
que os deputados e vereadores são
eleitos não graças aos seus próprios
votos, mas sim aos de seus partidos, é
inteiramente correta do ponto de vista da fórmula matemática de apuração num sistema de eleições proporcionais baseadas na lista aberta.
Ainda que o troca-troca partidário
tenha se reduzido no atual Congresso, o Brasil continua sendo o recordista mundial de infidelidade dos parlamentares aos seus partidos. Nas quatro legislaturas anteriores, a proporção média de deputados federais que
mudaram de legenda ao longo do
mandato vem superando um terço do
número total de parlamentares.
Historicamente falando, navegamos de um extremo ao outro nesse
quesito nas últimas duas décadas.
Durante o regime militar, a fidelidade
partidária era uma imposição legal, e
os deputados eram simplesmente
proibidos de mudar de partido. Essa
prática tinha um nítido caráter autoritário. A regra nos países democráticos é não haver regras que imponham
a fidelidade partidária.
Com a redemocratização, a questão
foi totalmente desregulamentada.
Pela primeira vez na nossa história, os
partidos políticos tornaram-se organizações de direito privado. Na verdade, a legislação em vigor apenas transferiu para os próprios partidos a tarefa de definir suas regras internas de fidelidade. A verdade é que a maioria
deles simplesmente nunca o fez. A infidelidade partidária atingiu níveis
sem paralelo em outros países democráticos. Os partidos saem das urnas
com um tamanho, mas se apresentam
na eleição seguinte com um tamanho
diferente, em nítido desrespeito ao
ordenamento feito pelos eleitores.
Claramente, medidas que incentivem a fidelidade partidária são mais
que necessárias. Naturalmente, desde que não signifiquem a imposição
de uma arbitrária camisa-de-força legal que inviabilize a mudança de partido em casos extremos. Felizmente,
essa tem sido exatamente a trajetória
observada nos últimos tempos.
A Câmara dos Deputados recentemente aprovou uma alteração do seu
regimento interno que modificou o
critério para o cálculo do número de
representantes de cada partido nas
comissões permanentes da Casa. A
regra passou a ser a bancada eleita
por cada legenda, e não mais a bancada na data da posse da legislatura. Um
projeto semelhante também está tramitando no Senado Federal.
O próprio TSE havia baixado uma
resolução no ano passado pela qual a
divisão do tempo de propaganda partidária nos meios de comunicação
também passou a levar em conta só as
bancadas eleitas por cada legenda.
Portanto, a decisão anunciada nesta semana é somente mais um passo
num lento processo de aperfeiçoamento das regras existentes. Nada
que signifique um retorno a um passado de autoritarismo, mas um avanço em relação à virtual anarquia
atualmente existente.
A rigor, como não tem força de lei, a
decisão do TSE sequer imporá a perda obrigatória de mandato para todos
os parlamentares que mudaram de
partido. Na prática, a medida provavelmente só terá validade se o partido
prejudicado apelar à Mesa Diretora
da respectiva Casa legislativa ou, então, à Justiça Eleitoral.
No mínimo, este será um excelente
experimento para avaliar a real importância que os partidos atribuem
aos votos de seus eleitores.
ROGÉRIO SCHMITT, 38, doutor em ciência política pelo
Iuperj, é analista político sênior da Tendências Consultoria Integrada.
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