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FERNANDO RODRIGUES
Desincompatibilização
BRASÍLIA - Hoje e nos próximos
dias dezenas de políticos devem
deixar seus cargos nos governos federal e estaduais. É a idiossincrasia
brasileiríssima batizada pelo nome
de desincompatibilização.
Assimétrica e esquizofrênica, a
regra permite a permanência na cadeira a quem disputar o mesmo cargo. Assim, um governador interessado em mais um mandato está autorizado a concorrer à reeleição
sem deixar a função. Mas um secretário ou ministro interessado em
ser deputado precisa renunciar.
O objetivo suposto da lei é ingenuamente evitar que os políticos se
aproveitem do cargo para alavancar
suas campanhas. O velho hábito de
tentar mudar a realidade por meio
de uma canetada.
Ou alguém duvida que Dilma
Rousseff continuará a ter forte influência sobre o que fará a Casa Civil a partir de amanhã? Ou que José
Serra continuará a ter linha direta
com seu sucessor no governo de São
Paulo? Em certa medida, a desincompatibilização é útil aos políticos: permite a eles usarem o poder
de forma dissimulada.
Seria mais simples para a sociedade enxergar abusos se todos ficassem em seus cargos. Haveria
transparência nas ações. Até porque, pelo menos, se saberia a origem do salário de cada um. A partir
de amanhã, não será possível saber
de onde dezenas de ex-secretários
estaduais vão extrair seus recursos.
Esse defeito da lei faz parte do rígido calendário eleitoral da jovem
democracia brasileira. A partir do
Domingo de Páscoa, abre-se uma
espécie de limbo de três meses.
Os
concorrentes ao Planalto não ocupam mais cargos, zanzam pelo país
em jatinhos, gastam fortunas, mas
são apresentados como pré-candidatos, e ninguém sabe como suas
contas são pagas exatamente.
Tudo bem. Como todos os políticos estão desincompatibilizados, os
eleitores podem dormir tranquilos.
Ninguém jamais ousará abusar do
dinheiro público.
fernando.rodrigues@grupofolha.com.br
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