São Paulo, Sábado, 31 de Julho de 1999
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O governo tem permitido que os preços dos pedágios das rodovias se tornem abusivos?

SIM
É hora de baixar as tarifas

ROMEU NERCY LUFT

Os governos estaduais e federal não apenas permitem a prática de preços abusivos nos 180 postos de pedágios que proliferam pelo país como são os autores dessa prática perversa.
Mentor da política de concessões, o governo federal revelou uma saudável preocupação ao formular seu modelo: a de evitar que os custos do pedágio ultrapassassem os benefícios trazidos pela melhora do estado de conservação das rodovias.
Para atingir o objetivo, fixou um teto máximo para as tarifas, equivalente aos benefícios obtidos pelos usuários, estabelecendo que venceria as licitações quem oferecesse o menor preço de pedágio.
Na prática, contudo, o DNER acabou superestimando tais benefícios, ao adotar custos operacionais inflados para os veículos. Especialmente para os caminhões, a tarifa é muito maior do que a economia obtida. Assim, embora concebido com objetivo oposto, o pedágio se transformou em mais um pesado componente do "custo Brasil".
Além de superestimadas, as tarifas são monopolistas (ao contrário do que ocorre em outros países, aqui o governo não oferece percursos alternativos) e começam a ser cobradas antes mesmo que a concessionária realize investimentos mínimos.
Não é de estranhar, portanto, que o negócio seja, desde cedo, altamente lucrativo. Enquanto na Europa o retorno do investimento só começa depois de oito ou dez anos, a NovaDutra, por exemplo, fechou o balanço no azul em 1997. Em 1998, a empresa ostentava invejável lucro bruto de R$ 92 milhões, equivalente a 41,7% do seu faturamento líquido.
Estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul, não satisfeitos em transferir aos usuários os custos de conservação, acabaram transformando as concessões em fontes de receita complementares ou de redução de despesas.
Nesses Estados, o governo define a tarifa e concede as rodovias às empresas que oferecerem maior remuneração ou a conservação gratuita de maior quilometragem adicional.
Num lote como o da Anhanguera/ Bandeirantes, em São Paulo, o ônus da concessão chega a R$ 1,8 bilhão e representa cerca de 30% da receita prevista. Isso onera sobremaneira os custos do transporte.
Um caminhão de três eixos, com 12 toneladas de carga, que vai de São Paulo até Igarapava, na divisa com Minas, paga nada menos que oito pedágios, totalizando R$ 96. Isso encarece o frete em R$ 8 por tonelada, num percurso em que o frete-carreteiro não passa de R$ 20.
No caso particular dos caminhões, outro fator que torna ainda mais abusivo o pedágio é a cobrança em dobro por eixo em relação aos automóveis. Tal discriminação torna o pedágio dos comerciais em São Paulo mais caro do que na Itália, por exemplo, onde veículos de carga e automóveis pagam a mesma tarifa por eixo.
Infelizmente, o modelo adotado não prevê também a redução gradual da tarifa conforme o número de eixos, política usual na maioria dos países adiantados. Afinal, quanto maior o número de eixos, menor o dano ao pavimento por tonelada.
A generalizada insatisfação com as tarifas abusivas foi a mola mestra da recente paralisação geral dos transportadores autônomos, não apoiada pelas entidades patronais. O sucesso inesperado do movimento indica que, a exemplo do que já aconteceu na Argentina, é chegada a hora de baixar os pedágios também no Brasil. O exemplo mexicano mostra que as concessionárias que se opuserem a essa medida inevitável correm o risco de matar a galinha dos ovos de ouro.


Romeu Nercy Luft, 52, economista, é presidente da Associação Nacional do Transporte de Cargas (NTC) e diretor da Confederação Nacional dos Transportes (CNT).



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