São Paulo, sábado, 31 de agosto de 2002

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CARLOS HEITOR CONY

Fim de governo

RIO DE JANEIRO - Tradição antiga, fim de governo é assim mesmo. Os contínuos não mais se levantam quando o diretor chega, o café servido às visitas é frio e frio é o tratamento que os chefes recebem de seus subordinados. Tudo vai mudar e todos se preparam de uma forma ou de outra para os tempos que se abrem.
Conhecido meu, do escalão intermediário da República, esteve nesta semana em Brasília e voltou horrorizado. "Está tudo de pernas pro ar!" O expediente é tocado por subalternos, nenhuma decisão é tomada, assuntos pendentes ficam mais pendentes, pois todos querem saber para onde o vento está soprando.
O pior de tudo é que, tal como na meteorologia, não existe um vento específico, e sim ventos que sopram em várias direções. Os anemômetros registram a velocidade de um e de outro, mas não há certeza sobre o vento mais forte que irá predominar -e aí a confusão é geral.
Para piorar a coisa, e diferentemente de outras eleições, os caminhos conhecidos da política estão embaralhados -gente da esquerda aliada à direita, gente da direita falando em reforma agrária, gente da esquerda puxando o saco do FMI e, no meio disso tudo, gente que habitualmente fica em cima do muro tomando posições radicais e radicais ficando em cima do muro.
Como não frequento o poder, não tomo o café frio servido neste fim de governo. Tampouco pretendo tomar o café feito na hora do próximo governo, seja ele qual for. Até certo ponto, distraio-me com o espetáculo que alguns levam a sério, descobrindo virtudes nuns candidatos e defeitos em outros.
Todos têm as suas virtudes e os seus defeitos, como todos nós, irmãos feitos no mesmo barro da miséria humana. Agora, brigar por um ou por outro me parece idiota. Aquele mesmo idiota que, segundo Shakespeare, conta uma história cheia de som e de fúria e que nada significa.


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