São Paulo, domingo, 31 de dezembro de 2006

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Pobres moços

JORGE WERTHEIN

Na última década, entre os jovens brasileiros, a esperança de vida, em vez de aumentar, diminui assustadoramente

NOS ÚLTIMOS dez anos, o Brasil perdeu uma geração inteira de jovens vítimas da violência, segundo mostra o "Mapa da Violência 2006", que a OEI (Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura) divulgou há poucos dias.
O estudo mostra também que, entre os jovens de 15 a 24 anos, as causas externas -como homicídios, acidentes de transporte e suicídios em conjunto- são responsáveis por 72,1% das mortes. Esse dado, sozinho, já é altamente preocupante, pois se opõe ao registrado nas últimas pesquisas nacionais, que apontam para uma melhora gradual e constante das condições de saúde e de qualidade de vida da população.
Infelizmente, na última década, entre os jovens brasileiros, a esperança de vida, em vez de aumentar, está diminuindo assustadoramente.
Se, há 50 anos, as principais causas de morte entre os jovens estavam associadas a epidemias e a doenças, nas últimas décadas, o marco da mortalidade juvenil no Brasil se deslocou para os crescentes homicídios e acidentes de transporte.
Os dados do "Mapa da Violência 2006" mostram que, entre os jovens, os homicídios são responsáveis por 39,7% das mortes, os acidentes de transporte, por 17,1%, e os suicídios, por mais 3,6%. Em conjunto, essas três causas são responsáveis por quase dois terços das mortes de jovens brasileiros. Cada um desses fatores precisa de atenção especial.
Os dados alertam para o fato de que são urgentes respostas e políticas voltadas para a preservação da vida dos jovens brasileiros.
Esse não é um problema a ser resolvido exclusivamente pelo governo federal. Os governos estaduais e municipais também têm responsabilidade na adoção de medidas integradas que combatam a exclusão social, o desemprego e a falta de oportunidades. Esses fatores estão estreitamente vinculados para a explicação da crescente violência que atinge essa parcela da população.
Os problemas de exclusão enfrentados pelos jovens são conhecidos. Porém, o mais alto grau de exclusão social está entre os jovens que não estudam nem trabalham. Segundo estatísticas do IBGE, eles representam aproximadamente 5 milhões.
Iniciativas como o Prouni, o Projovem, a criação da Secretaria Nacional de Juventude e do Conselho Nacional de Juventude e várias outras desenvolvidas pela sociedade civil são importantes, sem dúvida, mas ainda resta muito a ser feito. Experiências em outros países (como os programas de segurança cidadã de Cali e Bogotá) e mesmo no Brasil, em localidades historicamente violentas, como Diadema e Osasco, em São Paulo, e Betim, Belo Horizonte e Contagem, em Minas Gerais, provam ser possível mudar e adotar políticas inteligentes que ajudem a reduzir a violência.
Diadema, por exemplo, conseguiu reduzir pela metade a taxa de homicídio em dois anos. O segredo foi combinar programas sociais com a adoção de medidas fiscalizadoras. É importante dotar as políticas públicas, em seu conjunto, de sensibilidade para os problemas específicos dos jovens, superando decididamente o enfoque limitado de trabalho setorial e centralizado.
Equivocadamente, alguns afirmam que o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) se transforma em incentivo poderoso ao banditismo. Eis um grave equívoco. Em vez de pensar em aumentar as penas, mais valeria tentar reduzir as causas que levam ao banditismo e a tantas mortes de jovens. A verdade é que a exclusão social e a falta de presente e de futuro são as principais causas da criminalidade e das mortes violentas de tantos jovens brasileiros.
Assim, para romper definitivamente com o ciclo de exclusão e ampliar as oportunidades da juventude tanto do meio rural quanto do meio urbano, é necessária a construção e o desenvolvimento de ações integradas nas áreas de educação, trabalho, saúde, segurança, esportes e lazer, entre outras, e em diálogo permanente com os próprios jovens.
Só assim será possível salvar essa geração que se perde a cada dia.


JORGE WERTHEIN, doutor em educação e mestre em comunicação pela Universidade Stanford (EUA), é assessor especial do secretário-geral da OEI (Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura).

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