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Janio de Freitas

O que fez a queda

'É um processo político', dizem desses episódios, mas não deveriam sê-lo. E é imoral que o sejam

NEM SE justifica a relação do (ex-)senador Demóstenes Torres com o contraventor Carlos Cachoeira nem foi por isso que teve cassado o seu mandato.

Se Demóstenes Torres fosse do PMDB ou do PT, não haveria cassação. O fato mais invocado pelos senadores, como peso decisivo para cassá-lo, foi ter mentido ao Senado com a afirmação de que conhecia Carlos Cachoeira "apenas superficialmente".

Muitos saíram então em sua defesa, na tribuna e pela imprensa, e depois se sentiram enganados. "Traídos", disseram Pedro Simon e Jarbas Vasconcelos sobre o seu sentimento.

Muito mais acintosas e numerosas foram as mentiras de Renan Calheiros e suas vaquinhas milagrosas. Para refutar as evidências de improbidade, até documentos inverdadeiros Renan Calheiros apresentou no Senado, como notas de vendas, proporcionadas por seu pequeno e esquelético rebanho, para comerciantes que negaram as compras.

Mas, sereno espectador das aflições finais de quem mais o acusara, lá estava Renan Calheiros entre os votantes de ontem. Na condição incontestável de um dos mais influentes senadores. Apesar de tudo. Tal como Romero Jucá e vários outros personagens de pequenos e de grandes casos escandalosos, mas sem consequências.

Não há dúvida de que no rol de acusações a Demóstenes Torres há afirmações infundadas, e não por equívoco. Certo fato verdadeiro é, porém, suficiente para comprometer a conduta do então senador. Trata-se da entrega, que lhe fez Carlos Cachoeira, de um telefone pretensamente protegido contra gravações alheias.

Neste ato estão implícitos dois reconhecimentos pelo contraventor e pelo senador. Um, o de risco de investigações por grampo telefônico; outro, o da necessidade de segredo das conversas entre eles. Logo, a iniciativa de Carlos Cachoeira e a aceitação por Demóstenes Torres são bastante sugestivas. E, se o contraventor tinha motivos para a providência, um senador não poderia tê-los.

Ainda assim, o relatório do senador petista Humberto Costa foi mais político do que objetivo. E com erros de informação e afirmação inadmissíveis, como Demóstenes Torres demonstrou.

"É um processo político", dizem desses episódios. Mas não deveriam sê-lo. E é imoral que o sejam, com sua grave interferência no destino de uma pessoa por interesse político, em geral mesquinho.

O dever dos relatores de comissões de ética e de CPIs é produzir relatórios substanciais e objetivos, o que é raríssimo.

Com a cassação, também o Senado perde. Em sua atividade propriamente de senador, Demóstenes Torres foi dos mais ativos, eficientes e rigorosos congressistas nos últimos tempos. Sua conduta lateral ainda está por ser explicada.

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