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Questões de Ordem

MARCELO COELHO - coelhofsp@uol.com.br

No mesmo rio

Os itens da denúncia, examinados um a um, não alteram o fato de que ela deve ser tomada em conjunto

O PRINCIPAL debate de ontem, no STF, recaiu sobre um personagem menos importante do mensalão. Trata-se do advogado Rogério Tolentino, amigo de Marcos Valério, acusado de participar em operações de lavagem de dinheiro.

Os fatos não eram nada favoráveis ao réu, e nisso todos os ministros concordavam. Tolentino conseguiu um empréstimo de R$ 10 milhões no banco BMG. "A pedido de Marcos Valério", esclarece a defesa. Logo depois, Tolentino deu a Marcos Valério três cheques em branco.

Acontece que Marcos Valério não estava propriamente necessitando de R$ 10 milhões emprestados. Tanto que ofereceu, como garantia para esse empréstimo, CDBs no exato valor de R$ 10 milhões.

Valério já tinha esse dinheiro: estava nas contas de outra empresa sua, a DNA. Só que aqueles milhões da DNA tinham origem ilícita. Vinham do Banco do Brasil, graças à ajuda ilegal de Henrique Pizzolato.

Desse modo, em vez de usar diretamente os recursos ilegais, Marcos Valério fez uma triangulação com o BMG e o seu amigo Tolentino. Os milhões, agora emprestados por Tolentino, estavam limpos.

Lavagem de dinheiro, evidentemente. Mas havia um problema para condenar Tolentino. Era uma questão formal, levantada pela defesa, e previsivelmente adotada pelo revisor Ricardo Lewandowski.

Um juiz não pode condenar ninguém por um crime que o Ministério Público não apontou. Ao que tudo indica, a denúncia do procurador-geral cochilou um pouco nesse ponto.

No item relativo à lavagem de dinheiro, acusava Tolentino de participar das operações de Marcos Valério com o Rural. Mas não falava explicitamente do outro banco, aquele do empréstimo suspeito, o BMG.

Se não falou, não dá para condenar... era esse o sentido dos argumentos de Lewandowski. Os problemas do BMG estão sendo julgados em outro processo, em instâncias inferiores.

Foi preciso reler vários trechos da denúncia para ver se, em outros capítulos, o empréstimo de Tolentino se enquadrava na punição desejada.

Joaquim Barbosa esclareceu o ponto, e teve uma frase irretorquível. Esta corte já não aceitou a denúncia do Ministério Público? Trata-se apenas, agora, de julgá-la procedente ou não.

De saber, portanto, se o empréstimo "triangulado" de Tolentino estava comprovado e se se enquadrava no crime de lavagem de dinheiro. Seria fora de propósito dizer que não.

Quanto aos aspectos formais, o presidente do STF fez um comentário. O problema foi fatiarem o julgamento. Os itens da denúncia, examinados um a um, não alteram todavia o fato de que a denúncia é uma só, e deve ser tomada em seu conjunto. Ayres Britto saiu-se com uma imagem poética. "Da nascente à foz, um rio é o mesmo rio".

A sessão foi das mais calmas. Haverá, sem dúvida, turbulências pela frente.

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