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FOCO
Mal remunerado e cansativo, trabalho de comitivas é "invisível", diz capataz
DO ENVIADO ESPECIAL A PARANAÍBA
A carne de sol passou a
noite ao relento, perto de um
fogão de lenha que, ainda na
madrugada, foi usado para o
preparo do café, essencial
para quem levanta às 5h todos os dias.
No cômodo, uma panela
pendurada na parede, a tralha espalhada na mesa feita
com dois cavaletes, garrafas
de cachaça e uma lata de banha dão a noção do espaço e
indicam como é o dia a dia do
peão boiadeiro.
Se está no estradão, troque
o cenário coberto por telhas
francesas pela sombra de
uma árvore.
É assim que o capataz de
boiada Jesus Antônio Martins, 49, inicia o dia quando
está levando gado de uma fazenda para outra ou mesmo
para o frigorífico.
Embora um dos seis ou sete peões do grupo tenha ficado acordado à noite, o primeiro trabalho dos peões
após o café é se certificar de
que bois não sumiram, para
seguir viagem.
A tarefa parece fácil, mas
são até 1.500 bois, que nos
primeiros dias percorrem até
25 quilômetros/dia nos corredores boiadeiros, total que
cai para seis quilômetros no
fim, no caso de viagens longas. Martins chegou a viajar
800 quilômetros.
Feito isso, o grupo inicia a
jornada no estradão, cada
um com uma função e com
duas mulas -além de pelo
menos outras três reservas.
O ponteiro leva a buzina à
frente da comitiva, normalmente com o comissário. Em
seguida surgem culateiros e
o arribador, que tem de arregimentar bois extraviados.
No meio do grupo vai o cozinheiro, responsável pela
queima do alho, prato típico
dos peões feito com carne seca, arroz carreteiro, feijão
gordo e farofa.
Há variações, como macarrão ou batata com carne
no lugar do arroz.
ESTOURO DA BOIADA
Durante o dia, o maior trabalho ocorre quando há um
estouro de boiada, que pode
comprometer uma marcha
-nome dado a um dia de trabalho no estradão.
"Cheguei a perder um dia
por causa de um estouro de
boiada perto de uma linha
férrea", disse o comissário
Elizandro Dias Costa, 33.
O cozinheiro e outro peão
passam à frente no meio da
jornada, para escolher o local onde será preparado o
jantar do grupo, de preferência perto de água, e onde os
peões pousarão.
No fim do dia, a boiada é
contada e, se for notada a falta de algum animal, peões
saem à procura, para justificar os R$ 650 que o grupo receberá -o comissário paga
refeições e outros gastos que
os peões têm e fica com algo
em torno de 30% do total.
O cozinheiro e o ponteiro,
funções mais importantes,
recebem R$ 50 e, o restante
do grupo, R$ 35 cada.
"Perto do que tem por aí,
até que é bom", disse o ponteiro Iron Batista da Silva, 46.
O dia termina para todos já
à noite, exceto para um deles, que fica de vigília.
"O estradão não é reconhecido. É como se a gente
fosse invisível", afirma Martins.
(MARCELO TOLEDO)
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