Ribeirão Preto, Domingo, 31 de Outubro de 2010

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FOCO

Mal remunerado e cansativo, trabalho de comitivas é "invisível", diz capataz

DO ENVIADO ESPECIAL A PARANAÍBA

A carne de sol passou a noite ao relento, perto de um fogão de lenha que, ainda na madrugada, foi usado para o preparo do café, essencial para quem levanta às 5h todos os dias.
No cômodo, uma panela pendurada na parede, a tralha espalhada na mesa feita com dois cavaletes, garrafas de cachaça e uma lata de banha dão a noção do espaço e indicam como é o dia a dia do peão boiadeiro.
Se está no estradão, troque o cenário coberto por telhas francesas pela sombra de uma árvore.
É assim que o capataz de boiada Jesus Antônio Martins, 49, inicia o dia quando está levando gado de uma fazenda para outra ou mesmo para o frigorífico.
Embora um dos seis ou sete peões do grupo tenha ficado acordado à noite, o primeiro trabalho dos peões após o café é se certificar de que bois não sumiram, para seguir viagem.
A tarefa parece fácil, mas são até 1.500 bois, que nos primeiros dias percorrem até 25 quilômetros/dia nos corredores boiadeiros, total que cai para seis quilômetros no fim, no caso de viagens longas. Martins chegou a viajar 800 quilômetros.
Feito isso, o grupo inicia a jornada no estradão, cada um com uma função e com duas mulas -além de pelo menos outras três reservas.
O ponteiro leva a buzina à frente da comitiva, normalmente com o comissário. Em seguida surgem culateiros e o arribador, que tem de arregimentar bois extraviados.
No meio do grupo vai o cozinheiro, responsável pela queima do alho, prato típico dos peões feito com carne seca, arroz carreteiro, feijão gordo e farofa.
Há variações, como macarrão ou batata com carne no lugar do arroz.

ESTOURO DA BOIADA
Durante o dia, o maior trabalho ocorre quando há um estouro de boiada, que pode comprometer uma marcha -nome dado a um dia de trabalho no estradão.
"Cheguei a perder um dia por causa de um estouro de boiada perto de uma linha férrea", disse o comissário Elizandro Dias Costa, 33.
O cozinheiro e outro peão passam à frente no meio da jornada, para escolher o local onde será preparado o jantar do grupo, de preferência perto de água, e onde os peões pousarão.
No fim do dia, a boiada é contada e, se for notada a falta de algum animal, peões saem à procura, para justificar os R$ 650 que o grupo receberá -o comissário paga refeições e outros gastos que os peões têm e fica com algo em torno de 30% do total.
O cozinheiro e o ponteiro, funções mais importantes, recebem R$ 50 e, o restante do grupo, R$ 35 cada.
"Perto do que tem por aí, até que é bom", disse o ponteiro Iron Batista da Silva, 46.
O dia termina para todos já à noite, exceto para um deles, que fica de vigília.
"O estradão não é reconhecido. É como se a gente fosse invisível", afirma Martins. (MARCELO TOLEDO)


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