São Paulo, domingo, 27 de setembro de 2009

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VINTAGE

Richards pode fazer o primeiro desfile de sua história

por ALCINO LEITE NETO

"Nunca pensei muito no estilo da richards", afirma o dono da Grife carioca, que lança lojas dedicadas a artigos de couro

O estilista e empresário carioca Ricardo Dias da Cruz Affonso Ferreira foi a apenas três desfiles em toda a sua vida. "Acho chato demais, prefiro uma pescaria", diz.

Ele também quase não folheia revistas de moda. "Não conheço nenhum amigo que compra", brinca. E, ao criar suas roupas, nem mesmo se preocupa com as ditas tendências da temporada. "Se você me perguntar quais são as do momento, não sei dizer, procuro não me deixar contaminar por isso", afirma.

Apesar dessa indiferença pelo mundo da moda (ou talvez por isso mesmo), Ricardo construiu uma das grifes preferidas dos homens brasileiros, a Richards. Com seu sportswear clássico, de referências tropicais e mediterrâneas, a marca tem ainda algo bastante raro na moda brasileira: uma personalidade forte e firme. Criada há 35 anos, durante todo esse tempo perseverou em seu estilo, sem se deixar levar pelos gostos de ocasião.

Até 2003, a Richards só produzia para homens. Hoje, a linha para mulheres –dirigida pela estilista Glória Marques– praticamente divide as atenções da marca: dos 4.500 itens criados por ano, 2.500 são femininos. Em 2008, a empresa vendeu 1,6 milhão de peças para homens e mulheres, em suas 41 lojas próprias e 23 franquias (além de 180 multimarcas), faturando cerca de R$ 200 milhões.

Em plena renovação –de ideias e estratégias de negócios–, a grife prepara para o final do ano o lançamento da Richards Selaria, uma rede de lojas dedicadas exclusivamente a artigos de couro, de calçados a bolsas e acessórios, masculinos e femininos. Feita em regime de franquia, a primeira loja será inaugurada em Campinas (SP).

A empresa também quer levar a cabo em 2010 o projeto de abrir o capital, levando suas ações à Bolsa de Valores. A Richards hoje tem seis sócios, sendo Ricardo o sócio majoritário. A empresa é dona de 50% da Salinas –em parceria com Jacqueline de Biase, criadora da grife de moda praia– e se ligou há poucos meses à nova marca de surfwear Bintang, que já abriu loja em Búzios e em Salvador.
Para os fashionistas, porém, a principal novidade da Richards é a perspectiva de a marca realizar o primeiro desfile da sua história, no Fashion Rio.

O convite foi feito por Paulo Borges, diretor do evento carioca e da São Paulo Fashion Week, que esteve nos escritórios da Richards no final de agosto. "Os argumentos dele foram muito convincentes, ficamos honrados com o convite, mas ainda estamos decidindo", diz Ricardo.

O próximo Fashion Rio acontece em janeiro, e até a semana passada a grife ainda não havia dito nem sim, nem não. Trata-se de uma decisão difícil para a Richards, já que desfiles não estavam entre seus planos –até agora.

DIA ENORME E LUZ INTENSA

Filho da alta burguesia carioca, Ricardo, 65, lembra-se do avô empreiteiro conduzido em seu carro por um motorista de luvas brancas. "Mas eu cresci na segunda fase da família, quando o dinheiro havia acabado, embora o jantar ainda fosse servido em talheres de prata", conta.

Quando estudava engenharia, gostava de frequentar o jóquei e achava os arreios dos cavalos "um espetáculo". Foi a partir deles que teve a ideia de criar cintos masculinos, por onde começou sua carreira de estilista. Em 1969, abriu com a irmã a loja Krishna, no Leblon. Três anos depois, criou a Mr. Krishna, só para homens. Em 1974, surgiu a primeira Richards –nome copiado de uma loja de esportes de Nova York.

Uma viagem ao litoral sul da França provocou o "estalo" criativo que faltava ao estilista. Ricardo se apaixonou pela luz da Provence, pelas roupas despojadas dos pescadores, pelo "savoir vivre" dos povos mediterrâneos.

A essas referências, acrescentou um pouco da tradição inglesa, "muito aristocrática e masculina", diz. E, naturalmente, apimentou tudo com a desenvoltura e o humor cariocas. "Mas nunca pensei muito no estilo da Richards. Nos primeiros 25 anos da marca, eu dividia as coisas entre o que gostava e o que não gostava", afirma.

Daltônico, incapaz de distinguir o vermelho do verde, e vice-versa, Ricardo conta que no início ficava inseguro ao tomar certas decisões sobre a cor da roupas. "Mas me acostumei", diz. Ele descarta, porém, a hipótese de ter privilegiado as cores neutras na cartela da marca em razão do daltonismo.

A paixão pelo Mediterrâneo perdura até hoje em Ricardo Charuto, como foi apelidado na juventude pelos amigos. Uma vez por ano, ou até mais, ele viaja para Toulon (França), onde está atracado seu iate, a fim de percorrer a costa da Europa e da África. Esportista apaixonado, Ricardo já foi campeão de caça submarina, que continua sendo uma de suas atividades preferidas. Também pratica ciclismo e paddle boarding –espécie de prancha de surfe larga com remo.
Além disso, é ele quem prepara diariamente o café da manhã dos dois filhos (de 12 e 14 anos) de seu segundo casamento. "É um ritual que faço questão de seguir", diz. Do primeiro casamento, Ricardo tem outros três filhos, entre eles a também estilista Bianca Graham.
Para ele, a família é componente essencial do próprio imaginário da Richards. "Sempre que penso na imagem da grife, vejo um sujeito junto de sua mulher e seu filho, todos usufruindo de um lugar agradável, de um dia enorme, com uma luz intensa", descreve. Não é exatamente com a moda que Ricardo sonha, mas com o paraíso.

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