São Paulo, domingo, 28 de novembro de 2010

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GASTRONOMIA

Segredos de Champanhe

por JOSIMAR MELO, em Champanhe

Uma visita à região da frança onde nasceu o mítico espumante, produzido com o cuidado de uma jóia

Chega dezembro, e uma febre assola o mundo. O consumo de champanhe explode como o festivo estouro da rolha deste espumante mítico, nascido no norte da França, mas com centenas de aparentados produzidos em vários países. No mês das borbulhas, espoucam espumantes de várias origens; mas para entender a fonte de inspiração para esse tipo de bebida, nada como conhecer a sua matriz –o champanhe francês. E para quem pode, um belo caminho é mergulhar numa das marcas mais emblemáticas, a Krug.
Não é tão fácil. Das variedades produzidas pela maison, mesmo a mais "comum" –a Grande Cuvée– é cara, feita quase como uma joia. As grandes casas de champanhe costumam ter sempre uma edição de prestígio, com pequena produção de seu produto mais sofisticado. A Krug começa onde os outros terminam: o seu básico já é o top para a região (e, acreditem, ela também tem seu top).
Fundada em 1843, a marca há muito tempo pertence a grandes empresas –no momento, é do conglomerado de luxo francês LVMH (Louis Vuitton Moët Hennessy). Mas seus produtos continuam elaborados sob os cuidados da família do fundador Johann-Joseph Krug.
"Entender a Krug é simples. É um champanhe para quem gosta de champanhe", diz Olivier Krug, um dos responsáveis pela qualidade da bebida, com quem conversei em Paris horas antes de um evento de harmonização dos seus vinhos com pratos preparados por chefs de seis países (Brasil incluído, com o chef Tsuyoshi Murakami), na Escola de Belas Artes da cidade.
Desenvolvido no final do século 17 por vinicultores como o monge beneditino don Pérignon, entre outros, o champanhe é um vinho espumante em cuja composição são admitidas por lei somente três uvas: duas tintas (pinot noir e pinot meunier) e uma branca (chardonnay). Com elas (ou, no mínimo, uma delas) se faz um vinho base (majoritariamente branco, mas hoje o rosé está na moda), que depois é novamente fermentado nas garrafas, quando se produz o gás e as famosas borbulhas.
Para executar esse processo, a Krug segue algumas regras que são raras. Por exemplo, a totalidade de seus vinhos é produzida em pequenos barris de carvalho. Eles são feitos para envelhecer por pelo menos seis a oito anos. E a decisão sobre a mescla exata dos vários vinhos, de vários vinhedos e safras, para fazer a linha principal da casa, o Grande Cuvée, demanda todo ano meses de trabalho do comitê de degustação. Deste fazem parte três membros da família –além de Olivier, também seu pai e tio, os irmãos Henri e Rémi Krug –, que junto com os enólogos da empresa provam milhares de amostras até chegar à "receita" aprovada.
"Nós não vinificamos uvas; vinificamos vinhedos", explica Olivier. De cada vinhedo sai um estoque da bebida, guardado em tonéis de aço inoxidável, no que eles chamam de biblioteca da casa. Desses estoques vão saindo os vinhos que, misturados, formam o champanhe engarrafado a cada ano.
A totalidade da produção da Krug –cerca de 500 mil garrafas/ano– mal chega a compor 0,2% da produção total de champanhe francês, mas está no topo da qualidade da região. E, dentro desse topo, há uma verdadeira joia rara: o Krug Clos de Mesnil, elaborado somente com uvas chardonnay de um pequeno vinhedo (que dá nome ao vinho) que visitamos numa ensolarada manhã.
Ele fica no povoado de Mesnil-sur-Oger, aninhado num microclima favorável em uma suave inclinação face sudoeste. Foi comprado por Henri e Rémi Krug em 1971, como parte de seis hectares de vinhedos. Quando visitaram a propriedade, perceberam a existência dessa pequena gleba em particular, de 1,85 hectares, que datava de 1698, como atestava uma placa em um de seus muros.
Durante oito anos, eles replantaram o vinhedo e, ao provar o vinho produzido em 1979, no lugar de utilizá-lo para fazer suas mesclas habituais, decidiram engarrafá-lo assim mesmo. Nascia um novo ícone do moderno champanhe.


Os champanhes, os chefs e seus pratos
em evento realizado no histórico edifício da Escola de Belas Artes de Paris, seis estações com mesas acomodaram seis chefs de cozinha,
cada um de um país, servindo criações que procuravam harmonizar seus paladares com cinco champanhes

(1) Prato: trio Kinoshita (atum com molho de missô; vieiras em molho de soja vintage; cogumelos e quiabo servidos no limão).
Chef: Tsuyoshi Murakami, restaurante Kinoshita, em São Paulo

(2) Prato: linguado grelhado com vinho e gnocchi
Chef: Arnaud Lallement, chef do restaurante L'Assiette Champenoise, duas estrelas no guia Michelin, em Reims (França)

Harmonização: Krug Grande Cuvée: tem sabores profundos, mas também frescos, frutados e tostados

(3) Prato: black cod com laranja.
Chef: Roberto Okabe, restaurante Finger's, em Milão

Harmonização: Krug Rose: é complexo e elegante, com toques de fruta silvestre e especiarias

(4) Prato: ossos de galinha
Chef: Uwe Opocensky, hotel Mandarin Oriental, em Hong-Kong

Harmonização: Krug Vintage 1995: ano excepcional. Vinho com sabores de frutas maduras e intenso frescor

(5) Prato: galinha-d'angola defumada no chá com foie gras, puré de porcini e velouté de castanha
Chef: Angela Hartnett, restaurante Murano, uma estrela no guia Michelin, em Londres

Harmonização: Krug Vintage 1998: outra safra importante. O champanhe lembra groselha e compotas, e toques cítricos

(6) Prato: peixe hamachi com curry verde e gengibre
Chef: Tim Raue, restaurante Tim Raue, uma estrela no guia Michelin, em Berlim

Harmonização: Krug Clos du Mesnil 1998: verdadeiro néctar, tem peculiar sabor de mel; aromas de frutas cristalizadas e praliné

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