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livro
Autor correu Chile e EUA atrás de cachalote
DA REDAÇÃO
Em 1839, um editor de jornais chamado Jeremiah Reynolds escreveu na revista literária americana "Knickerbocker" a história de uma
mítica baleia branca no Pacífico. Doze anos depois, Herman Melville publicou
"Moby Dick", a história do
mito de uma baleia branca...
no Pacífico! Coincidência?
Armando Cartes Montory,
advogado e professor na Faculdade de Direito da Universidade San Sebastián, em
Concepción, no Chile, diz
que não. Depois de ver referências à publicação de Reynolds, Montory se lançou
numa pesquisa atrás da narrativa que, diz ele, influenciou Melville.
Em entrevista exclusiva à
Folha, Montory fala sobre a
jornada em busca do que
acredita ser o único livro
com a história de Mocha
Dick.
(PRISCILA PASTRE-ROSSI)
FOLHA - O que leva o sr. a acreditar que "Mocha Dick" inspirou
Melville a escrever "Moby Dick"?
ARMANDO CARTES - "Mocha
Dick" foi um pequeno texto
escrito em 1839, que fala de
uma baleia albina avistada na
costa do Chile em 1810, perto
da ilha de Mocha. Tenho certeza de que foi uma fonte de
inspiração para Melville, que
escreveu, na minha opinião,
a mais importante obra da literatura americana. É como
"Don Quixote" para a Espanha ou "Romeu e Julieta" para os ingleses.
FOLHA - Quais são as semelhanças entre os dois livros?
CARTES - "Mocha Dick" conta o que narravam os marinheiros sobre uma baleia albina avistada perto da ilha de
Mocha. E Melville navegou
em baleeiros pela costa, conheceu tripulantes chilenos.
Nunca parou no Chile, mas
ouviu histórias de outros capitães sobre a mítica cachalote e deve ter lido o texto de
Reynolds na revista literária
em que ela foi publicada. Em
"Moby Dick", ele fala de um
marinheiro chileno, ansioso
por capturar a baleia branca.
FOLHA - A origem do nome do livro de Melville também estaria
relacionada a "Mocha Dick"?
CARTES - Algumas pessoas
acreditam que ele teria usado "Moby" -e não "Mocha"- em homenagem a um
amigo chamado Richard Tobias Green, um velho marinheiro, companheiro de viagens de Melville, cujo apelido era "Moby".
FOLHA - Como o senhor soube
dessa publicação?
CARTES - Alguns livros trazem nos rodapés a menção a
ela. Mas eu não tinha muita
certeza da existência do livro. Mesmo assim, decidi
viajar à procura dele.
FOLHA - Qual foi o roteiro?
CARTES - No Chile, comecei
por Valdívia. Lá, visitei as
ruínas da estação baleeira,
que foi destruída em 1960
por um terremoto. Nas ilhas
de Mocha e Santa Maria conversei com moradores, filhos
e netos de pessoas que conheciam bem a história da
baleia Mocha. Estive também em Talcahuano, cidade
que foi um grande porto baleeiro do Pacífico no século
19. Nos EUA, fui a New London, onde fica a força de submarinos dos EUA, a New
Bedford [que tem importante museu baleeiro;
www.whalingmuseum.org] e a Newport, em Rhode
Island, considerada capital
mundial da indústria baleeira. Sua costa é um museu vivo, com livrarias, docas, museus e passeios temáticos.
Foi onde encontrei o livro.
De lá, segui para Nantucket,
cidade onde nasceu a indústria baleeira americana.
FOLHA - Quanto tempo a busca
durou?
CARTES - Passei três anos visitando ilhas, portos, museus, antiquários, sebos. Todos diziam que sabiam sobre
a existência do livro, mas
nunca o haviam visto. Um
dia entrei em um antiquário
com mais de 4.000 títulos sobre baleias, em New Bedford.
O dono disse: "Eu tinha esse
livro, mas vendi". Então, saí à
procura da pessoa que tinha
comprado. Encontrei e o
convenci a vender, por US$
70, aquela bela edição com
gravuras em madeira, de
1932. Agora já dá para ler tudo na internet, em inglês, de
graça (risos). Por isso, o livro
que vou lançar pela editora
Pehuén não traz apenas a
história de Reynolds. Ele
vem com um anexo contando meu trabalho de investigação e a importância das baleias na história do Chile.
FOLHA - Quando será o lançado?
CARTES - Durante a Libro [referindo-se à 28ª Feria Internacional del Libro de Santiago www.camaradellibro.
cl/filsa], agora em outubro.
O livro, que será bilíngue
[nas versões em inglês e em
espanhol] se chama "Los Cazadores de Mocha Dick".
FOLHA - Quais dos lugares visitados o senhor indicaria aos viajantes brasileiros?
CARTES - Eu destaco a ilha de
Mocha, que é uma reserva
natural rica em tradição e
onde não dá para chegar de
carro -só de navio ou avião.
As pessoas circulam pela ilha
montadas em cavalos. Também vale a passagem por Valdívia, uma cidade muito bonita. Há edifícios antigos,
boa gastronomia e dá para fazer gostosos passeios de navio. Convém ir entre setembro e março, época de calor.
FOLHA - Quem foi J. N. Reynolds,
o autor de "Mocha Dick"?
CARTES - Ele nasceu na Pensilvânia, em 1799. Era uma
pessoa extravagante. Tinha
alma de explorador e era editor de uma revista chamada
"The Spectator". Reynolds
tinha algumas teorias muito
estranhas. Ele achava que a
Terra era oca, um sistema
que chamava de "esferas
concêntricas". Então, fez
uma viagem à Antártica para
tentar comprovar que, dentro dela, havia uma civilização. Mas acabou desistindo
porque devia estar muito gelado (risos). Antes de terminar a viagem ele passou na
ilha de Mocha, onde passou
alguns meses, e conheceu a
ilha de Santa Maria.
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