São Paulo, quinta-feira, 02 de outubro de 2008

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livro

Autor correu Chile e EUA atrás de cachalote

DA REDAÇÃO

Em 1839, um editor de jornais chamado Jeremiah Reynolds escreveu na revista literária americana "Knickerbocker" a história de uma mítica baleia branca no Pacífico. Doze anos depois, Herman Melville publicou "Moby Dick", a história do mito de uma baleia branca...
no Pacífico! Coincidência?
Armando Cartes Montory, advogado e professor na Faculdade de Direito da Universidade San Sebastián, em Concepción, no Chile, diz que não. Depois de ver referências à publicação de Reynolds, Montory se lançou numa pesquisa atrás da narrativa que, diz ele, influenciou Melville.
Em entrevista exclusiva à Folha, Montory fala sobre a jornada em busca do que acredita ser o único livro com a história de Mocha Dick. (PRISCILA PASTRE-ROSSI)

 

FOLHA - O que leva o sr. a acreditar que "Mocha Dick" inspirou Melville a escrever "Moby Dick"?
ARMANDO CARTES
- "Mocha Dick" foi um pequeno texto escrito em 1839, que fala de uma baleia albina avistada na costa do Chile em 1810, perto da ilha de Mocha. Tenho certeza de que foi uma fonte de inspiração para Melville, que escreveu, na minha opinião, a mais importante obra da literatura americana. É como "Don Quixote" para a Espanha ou "Romeu e Julieta" para os ingleses.

FOLHA - Quais são as semelhanças entre os dois livros?
CARTES
- "Mocha Dick" conta o que narravam os marinheiros sobre uma baleia albina avistada perto da ilha de Mocha. E Melville navegou em baleeiros pela costa, conheceu tripulantes chilenos. Nunca parou no Chile, mas ouviu histórias de outros capitães sobre a mítica cachalote e deve ter lido o texto de Reynolds na revista literária em que ela foi publicada. Em "Moby Dick", ele fala de um marinheiro chileno, ansioso por capturar a baleia branca.

FOLHA - A origem do nome do livro de Melville também estaria relacionada a "Mocha Dick"?
CARTES
- Algumas pessoas acreditam que ele teria usado "Moby" -e não "Mocha"- em homenagem a um amigo chamado Richard Tobias Green, um velho marinheiro, companheiro de viagens de Melville, cujo apelido era "Moby".

FOLHA - Como o senhor soube dessa publicação?
CARTES
- Alguns livros trazem nos rodapés a menção a ela. Mas eu não tinha muita certeza da existência do livro. Mesmo assim, decidi viajar à procura dele.

FOLHA - Qual foi o roteiro?
CARTES
- No Chile, comecei por Valdívia. Lá, visitei as ruínas da estação baleeira, que foi destruída em 1960 por um terremoto. Nas ilhas de Mocha e Santa Maria conversei com moradores, filhos e netos de pessoas que conheciam bem a história da baleia Mocha. Estive também em Talcahuano, cidade que foi um grande porto baleeiro do Pacífico no século 19. Nos EUA, fui a New London, onde fica a força de submarinos dos EUA, a New Bedford [que tem importante museu baleeiro; www.whalingmuseum.org] e a Newport, em Rhode Island, considerada capital mundial da indústria baleeira. Sua costa é um museu vivo, com livrarias, docas, museus e passeios temáticos.
Foi onde encontrei o livro. De lá, segui para Nantucket, cidade onde nasceu a indústria baleeira americana.

FOLHA - Quanto tempo a busca durou?
CARTES
- Passei três anos visitando ilhas, portos, museus, antiquários, sebos. Todos diziam que sabiam sobre a existência do livro, mas nunca o haviam visto. Um dia entrei em um antiquário com mais de 4.000 títulos sobre baleias, em New Bedford.
O dono disse: "Eu tinha esse livro, mas vendi". Então, saí à procura da pessoa que tinha comprado. Encontrei e o convenci a vender, por US$ 70, aquela bela edição com gravuras em madeira, de 1932. Agora já dá para ler tudo na internet, em inglês, de graça (risos). Por isso, o livro que vou lançar pela editora Pehuén não traz apenas a história de Reynolds. Ele vem com um anexo contando meu trabalho de investigação e a importância das baleias na história do Chile.

FOLHA - Quando será o lançado?
CARTES
- Durante a Libro [referindo-se à 28ª Feria Internacional del Libro de Santiago www.camaradellibro. cl/filsa], agora em outubro.
O livro, que será bilíngue [nas versões em inglês e em espanhol] se chama "Los Cazadores de Mocha Dick".

FOLHA - Quais dos lugares visitados o senhor indicaria aos viajantes brasileiros?
CARTES
- Eu destaco a ilha de Mocha, que é uma reserva natural rica em tradição e onde não dá para chegar de carro -só de navio ou avião.
As pessoas circulam pela ilha montadas em cavalos. Também vale a passagem por Valdívia, uma cidade muito bonita. Há edifícios antigos, boa gastronomia e dá para fazer gostosos passeios de navio. Convém ir entre setembro e março, época de calor.

FOLHA - Quem foi J. N. Reynolds, o autor de "Mocha Dick"?
CARTES
- Ele nasceu na Pensilvânia, em 1799. Era uma pessoa extravagante. Tinha alma de explorador e era editor de uma revista chamada "The Spectator". Reynolds tinha algumas teorias muito estranhas. Ele achava que a Terra era oca, um sistema que chamava de "esferas concêntricas". Então, fez uma viagem à Antártica para tentar comprovar que, dentro dela, havia uma civilização. Mas acabou desistindo porque devia estar muito gelado (risos). Antes de terminar a viagem ele passou na ilha de Mocha, onde passou alguns meses, e conheceu a ilha de Santa Maria.


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