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ÚLTIMA CHANCE
Santiago de Cuba transpira trova e dança
Cidade onde Fidel deu início à Revolução de 1959 é palco de convivência autêntica entre visitantes e locais
DA ENVIADA ESPECIAL A CUBA
"Agora eu vou ensinar a rumba", diz, soltando os braços e
acelerando o ritmo das ancas ao
som que sai do aparelho de
DVD. Os turistas olham. "Mas é
igual ao outro!" Ela solta uma
risada, um movimento com a
cabeça, como quem diz que
"claro que não", e insiste.
A vendedora gordinha e sorridente, com um molejo de bailarina profissional, está em
uma loja de CDs no caminho
que leva ao Castillo del Morro
-a antiga fortaleza espanhola
hoje convertida no museu da
Pirataria- e sua inigualável
vista da baía de Santiago. Mas
poderia estar em qualquer lugar da segunda maior cidade de
Cuba. Tudo e todos ali exalam
música e dança.
Do outro lado
Fundada em 1515, Santiago é
uma das sete primeiras cidades
da época da colonização. Para
alcançá-la é preciso cruzar quase toda a ilha a partir de Havana
-são 12 horas de ônibus ou
quase três de avião para chegar
à penúltima Província no sudeste cubano.
Mas o périplo vale a pena.
Nas suas ruas estreitas, em
meio ao decadente casario espanhol que aos poucos vai se
desfazendo em cortiços até alcançar o mar, entre praças com
coretos e restaurantes de uma
simplicidade quase amadora,
visitantes e moradores convivem numa sintonia bem mais
harmônica e autêntica do que o
apartheid velado que é visto em
Havana.
É a música que dá a liga. Santiago é a terra da trova, ritmo
reapresentado ao mundo pelo
cineasta Win Wenders em seu
"Buena Vista Social Club"
(1999). Ali não é difícil entrar
num restaurante modesto para
um almoço rápido e se deparar
com uma apresentação digna
de qualquer casa de concertos.
Haverá sempre os oportunistas, é claro, dispostos a lucrar
com a fama. Mas em Santiago é
mais fácil acertar do que errar.
Embora música e dança estejam em todo lugar, dois deles
são imperdíveis -tanto para os
turistas quanto para os santiagueros: a Casa da Trova e a Casa
das Tradições.
A primeira, na calle Heredía
-onde se aglutinam as principais atrações culturais da cidade-, oferece shows diários a 3
pesos conversíveis em seu pátio nos fins de tarde, além de
um restaurante e de uma razoável loja de CDs, a ArtEx.
Toda noite, o casarão branco
e azul vê transbordar suas
imensas varandas, com grupos
de trova tocando a 8 pesos de
entrada para um salão lotado.
Encontrar par para dançar é fácil: cubanos e cubanas sorridentes oferecem-se para acompanhar. Alguns o fazem pelo
prazer da conversa e da dança,
outros pedirão uma bebida.
Há ainda os que estão ali para
transformar a noite em algo
mais lucrativo: embora oficialmente proibida em Cuba, a
prostituição (masculina e feminina) ainda é um mercado borbulhante no país, e os turistas
são o alvo primeiro (afinal,
muitos estão ali com esse exato
propósito).
Já a Casa das Tradições, escondida em uma viela fora do
centro histórico (pegar um táxi
é altamente recomendável), fica em um imóvel bem mais modesto. É uma espécie de associação de bairro sem grande infra-estrutura. A visita, no entanto, é obrigatória: a animação
do grupo titular da casa faz esquecer qualquer contratempo,
e assistir aos locais dançando é
um espetáculo por si só.
Porto de Fidel
Além de música, a cidade
perspira história: foi ali que Fidel Castro chegou com o iate
Granma, vindo do México, para
a revolução que o levaria ao poder em 1959. Vale conhecer o
singelo prédio que abriga a Prefeitura, na mesma praça em
que fica o principal hotel da cidade, o Casa Granda.
Do pequeno balcão no terceiro andar Fidel fez seu primeiro
discurso ao país como comandante. Quando a mudança vier,
Santiago certamente guardará
os últimos resquícios da "ilha
do dia anterior".
(LUCIANA COELHO)
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