São Paulo, quinta-feira, 07 de agosto de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Navio foi uma "escola de vida" para Bassoleil

DA REPORTAGEM LOCAL

Como guardar um cadáver em alto-mar? Na câmara frigorífica, junto dos legumes.
Pode não parecer a resposta mais correta, mas foi a solução adotada três vezes a bordo do Mermoz dos Croisieres Paquet, navio em que o chef Emmanuel Bassoleil passou três anos trabalhando na cozinha. "Cobríamos o defunto com uma coberta e... geladeira!", conta, rindo.
Ele se apressa em dizer que agora é diferente, mas que, naquela época, a única solução em um navio pequeno era ajeitar o sujeito no fundo da câmara frigorífica.
Conversar com Bassoleil sobre as duas voltas ao mundo que ele deu a bordo desse pequeno navio, entre 85 e 87, poderia durar horas. Ele se diverte. Ri. Revive. Traz à tona histórias saborosas de bastidores, que levam o interlocutor a pedir alguns minutos mais da entrevista dada por telefone, num dos intervalos no comando da cozinha do Skye, em São Paulo.
Dos causos de que mais gosta, outro que o diverte é sobre uma noite em que o cruzeiro atravessava o Pacífico, próximo às ilhas Fiji. O relógio marcava 20h, e os passageiros começavam a desfilar "black ties" e longos no "jantar do comandante".
No menu, lagosta, foie gras, caviar. Ficou com água na boca? Os 600 passageiros e os 300 tripulantes também. "Uma tempestade levou tudo para o chão: mesas, louças e toda a comida das panelas!"
Um incidente bobo, se comparado às 48 horas sem água e sem comida em águas brasileiras, no encalhe do navio na travessia Belém-Santarém-Manaus. Mas tudo era visto como aventura pelo aprendiz de cozinheiro, então com vinte e poucos anos.
"Por mais difícil que fosse, era a realização de um sonho." Bem, "difícil" chega a ser um adjetivo generoso para a rotina estafante. "Nunca tive um dia de folga. Mesmo quando parávamos em algum lugar, tinha uns "chatinhos" que insistiam em comer no navio", diz, rindo.
O relógio tocava às 6h. A chamada na cozinha era feita às 7h. Era quando o trabalho começava e só dava uma pausa para o almoço, às 14h30. Às 18h, todo mundo na cozinha, para novo batente, até as 22h. Depois, balada -dentro ou fora do Mermoz, que entrava pela madrugada.
Hoje, ele afirma que não trabalharia num navio. "Agora é tudo muito grande. Prejudica a qualidade da comida." Sobre a maior lição tirada dos tempos no mar, ele diz: "Aprendi a operar, tecnicamente, um jantar para 600 pessoas da mesma forma que preparo para cem".
(PRISCILA PASTRE-ROSSI)


Texto Anterior: Viajar e comer: Chefs reprovam a comida e indicam como evitá-la
Próximo Texto: Viajar e comer: Bandeja é servida antes ou depois das demais
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.