São Paulo, quinta-feira, 23 de junho de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

DA SAVANA AO JARDIM

Papéis se invertem após apartheid, e brancos enfrentam mudanças

Política de cotas é tema de disputa

DO ENVIADO ESPECIAL À ÁFRICA DO SUL

O governo sul-africano vem tentando igualar a situação econômica e social de brancos e negros desde o fim do apartheid, em 1994. Porém a tarefa é complicada. Com 47 milhões de habitantes, a porcentagem de negros no país é de 75,2%. Da população negra economicamente ativa, quase a metade não tem emprego, e calcula-se que um em cada cinco adultos seja portador do HIV.
A situação nas outras parcelas da sociedade é melhor, até mesmo entre os "coloureds" e os indianos. Os "coloureds", que totalizam 4,1 milhões de pessoas, têm uma taxa de desemprego de cerca de 20%. Entre indianos (1,1 milhão de habitantes) e brancos (4,4 milhões), a taxa de desemprego não ultrapassa os 10%.
Para compensar a diferença, uma política de cotas tem forçado empresas a contratar negros e a colocá-los em cargos altos. "Coloureds" e indianos são favorecidos, apesar de muitos negros afirmarem que essas duas camadas não sofreram tanto no apartheid.
Por meio dessa política de cotas, cada vez mais negros vêm alcançando postos de liderança na iniciativa privada, produzindo uma nova classe média, com jovens esperançosos em relação ao futuro.
Já entre os brancos o cenário é diferente. Há 11 anos, toda a elite do país era branca. Hoje, apesar de a situação dos brancos ser melhor, uma boa parcela deles viu a sua situação financeira decair.
Jovens enfrentam enormes obstáculos colocados pela política de cotas para conseguir empregos. Dezenas de milhares deles deixaram a África do Sul desde 1994 rumo a outros países, especialmente ao Reino Unido. Os brancos sabem que, a partir de 1994, eles se tornaram uma minoria e que a melhor maneira de viver nesse sistema é por meio da integração. Mas, aos poucos, começa a surgir uma ideologia do individualismo, na qual parte da população branca afirma que o mérito para conseguir um emprego deve ser individual e não racial.
Dessa forma, brancos capacitados não ficariam em um escalão abaixo dos negros nas empresas. Essa ideologia é defendida pela Aliança Democrática, segunda maior força política do país hoje, atrás apenas do CNA (Congresso Nacional Africano).
O partido conta com o apoio de três quartos dos brancos, além de uma boa parcela dos "coloureds" e dos indianos. Porém é sabido que muito dificilmente a Aliança Democrática conseguirá substituir o CNA no poder.
O maior temor dos brancos ainda é que o país futuramente adote políticas antibrancos como as do Zimbábue, que é governado pelo ditador Robert Mugabe.
O presidente da África do Sul, Thabo Mbeki, mantém relações com o regime ditatorial vizinho, o que provoca mal-estar entre os brancos no Zimbábue, onde algumas fazendas foram confiscadas.
Analistas afirmam que duas coisas impedem, por enquanto, que isso ocorra: a presença de Nelson Mandela, figura respeitada por todos, inclusive pelos brancos, por ter levado adiante uma política conciliadora, e a Copa do Mundo de 2010, aposta do país para melhorar a economia.
(GUSTAVO CHACRA)


Texto Anterior: Rota costeira extrapola lado safári
Próximo Texto: Divisão racial vai além de negro, mulato e branco
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.