São Paulo, domingo, 13 de janeiro de 2008

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CAPITÃES DA INDÚSTRIA/MARCOS S. DE OLIVEIRA

Edge será um dos quatro focos da Ford em 2008

Presidente da Ford quer importar o "crossover" e adaptar o novo Focus europeu à fábrica da Argentina

FABIANO SEVERO
DA REPORTAGEM LOCAL

Marcos S. de Oliveira completa 24 anos de Ford em 2008. Já viu, em 1995, a companhia pensar em fechar a fábrica de São Bernardo do Campo e deixar o país para se tornar só importador. Hoje comemora o recorde de vendas e crê que o Brasil possa virar um dos centros de desenvolvimento de produtos globais.

Crescer sem depender de pai e mãe. Assim, como ex-diretor de plataforma da Ford norte-americana, que ainda acumula prejuízos, o engenheiro Marcos S. de Oliveira, 47, preside, há um ano, a Ford Brasil.
Nascido e criado no ABC paulista, está na montadora desde 1984 e hoje comemora o sucesso do EcoSport, um dos responsáveis pela fase lucrativa da filial brasileira. Foi presidente da Ford México, passou por Espanha e África do Sul e "mandou" os primeiros Fusion, que surpreenderam até a Ford.
Oliveira conversou com a Folha e avaliou o ano à frente da quarta (e longe da terceira) maior montadora do país.  

FOLHA - A Anfavea [associação dos fabricantes de veículos] divulgou o balanço de produção de 2007, que cresceu 14%, e prevê alta de 9% neste ano. A Ford acredita na redução?
MARCOS S. DE OLIVEIRA
- A indústria deve crescer, em 2008, de 15% a 17%. Na produção, esse crescimento será compensado pela redução na exportação, que deve cair em torno de 5%.

FOLHA - A alta de 1,5% para 3% ao ano no IOF [Imposto sobre Operação Financeira] vai prejudicar as vendas?
OLIVEIRA
- Não. O consumidor não está preocupado só com o valor final, mas com o quanto terá de pagar por mês. E R$ 20, R$ 25 a mais não são suficientes para deixar de comprar.

FOLHA - Com planos de financiamento longos, como o anunciado pela Ford (84 meses), não preocupa o grau de endividamento do cliente?
OLIVEIRA
- Sim, mas não a curto prazo. O brasileiro tem de administrar o acesso ao financiamento, e não entrar na fria de achar que tem mais poder aquisitivo do que tem. Talvez seja uma preocupação para 2010.

FOLHA - A Fenabrave [federação dos concessionários de veículos] divulgou o registro de emplacamentos de 2007. A participação da Ford caiu pelo terceiro ano consecutivo. Em 2005, era de 12,13%. Em 2006, caiu para 11,25%, e em 2007, fechou em 10,55%. Por que a queda?
OLIVEIRA
- Começamos 2007 sabendo que iríamos perder mercado devido à nossa limitação na capacidade de produção. O volume de vendas bateu recorde, mas não acompanhou o do mercado. A Ford cresceu 21%, e o mercado interno, 28%.

FOLHA - Hoje a fábrica de São Bernardo só tem capacidade de produzir 60 mil Ka por ano. Não é pouco?
OLIVEIRA
- Sem dúvida. Nossos concorrentes têm capacidade maior. Mas a fábrica de São Bernardo opera com turno parcial. Nossa meta é ativar o turno completo em 2008 e aumentar a capacidade para 100 mil carros/ano. Há como ativar um segundo turno, que elevaria a produção para 200 mil carros.

FOLHA - Quando a Ford anunciou um investimento de R$ 2,2 bilhões até 2011, não falou em nova fábrica.
OLIVEIRA
- Não temos planos de uma nova planta. Trabalhamos abaixo da nossa capacidade. Em 2007, aumentamos nossa capacidade na fábrica de Pacheco (Argentina) em 15% com um turno. Só Camaçari opera no limite, com três turnos e capacidade para produzir 250 mil carros/ano. A estratégia das três fábricas funciona bem.

FOLHA - Mesmo assim, exceto no segmento do EcoSport, a Ford não lidera nenhum outro. Falta produto?
OLIVEIRA
- Temos uma estratégia de crescimento sustentável. A Ford não tem recursos para mover dos EUA e ajudar operações no Brasil. Por isso todo investimento local deve ser feito com recursos locais.

FOLHA - Pode-se dizer que o projeto Amazon tirou a Ford da lama?
OLIVEIRA
- Bem, com Camaçari, que produz Fiesta e EcoSport, saímos de uma posição de perdas financeiras grandes para a de lucratividade. Em 2007, começamos o ano com o EcoSport automático, depois os Fiesta hatch e sedã reestilizados, o Focus "flex", o EcoSport 2008 e, no fim do ano, o Ka.

FOLHA - Ou seja, faltará produto para ser lançado em 2008?
OLIVEIRA
- Não. Além do Ka, teremos mais três lançamentos.

FOLHA - Isso inclui o "crossover" Edge? O motor V6 foi homologado...
OLIVEIRA
- (risos) Vemos uma grande oportunidade para o Edge. Aliás, quando a sua reportagem será publicada?

FOLHA - No domingo [hoje].
OLIVEIRA
- (risos) Bem, só confirmamos que estudamos seriamente o Edge. Não sei a data.

FOLHA - Será que o sucesso do Fusion não garante a versão V6?
OLIVEIRA
- O Fusion foi um grande sucesso. Vendemos 60% mais em 2007 sobre 2006. O V6 é para médio prazo.

FOLHA - O jornal inglês "Birmingham Post" afirmou na semana passada que o grupo indiano Tata havia comprado as marcas Jaguar e Land Rover por US$ 2 bilhões. É verdade?
OLIVEIRA
- A Ford e a Tata estão em fase final de negociação.

FOLHA - Como ficam as operações no Brasil?
OLIVEIRA
- O consumidor estará protegido, as duas marcas têm tido boa aceitação no Brasil. Mercado em expansão e real forte são oportunidades para quem administrar as marcas.

FOLHA - No Salão de Detroit, que começa nesta semana, a Ford vai anunciar prejuízos menores que os US$ 12,6 bilhões referentes a 2006?
OLIVEIRA
- Pelos números de janeiro a setembro de 2007, vemos que será melhor que 2006. A Ford planeja voltar a lucrar nos EUA em 2009.

FOLHA - E o americano está mesmo preocupado com o ambiente?
OLIVEIRA
- Muito mais do que há cinco anos. Quando vemos o barril do petróleo chegar a US$ 100, os carros grandes e potentes perdem lugar para os menores e mais econômicos. O Salão de Detroit já não é mais um salão de carros V8.

FOLHA - Qual é a importância hoje da Ford Brasil para o grupo?
OLIVEIRA
- O Brasil deve ser hoje o terceiro ou quarto maior mercado para a Ford, depois de EUA, Inglaterra e Alemanha.

FOLHA - O Focus, mostrado na Alemanha em setembro, será feito na Argentina?
OLIVEIRA
- É a tendência natural das coisas. A Ford vai compartilhar plataformas globais adaptadas para cada mercado.

FOLHA - É a escola japonesa?
OLIVEIRA
- É. É a escola que faz sentido em investimentos de engenharia e de produção.

FOLHA - O Focus terá design europeu e plataforma e motores locais?
OLIVEIRA
- Essa é uma estratégia sul-americana. O Focus atual é o último "New Edge" [linhas com elementos ovalados], desenhado há muito tempo e adaptado para cá.

FOLHA - Compartilhar plataforma inclui peças? O Ka tem 85% de peças de outros modelos da Ford.
OLIVEIRA
- É a tendência de economia de escala. Precisamos usar desenhos, peças e sistemas que tenham sido usados e sejam eficientes. Carro todo novo passa por amadurecimento.

FOLHA - Mas, mesmo aproveitando as peças, o Ka teve de se render ao design padrão?
OLIVEIRA
- Sem dúvida. Mas na parte mecânica, não mudamos nada. Para o consumidor, não importa se aquele motor vem do carro A, B ou C. Ele precisa ser durável, ter um consumo baixo e bom desempenho.

FOLHA - E como fazer o tal carro de US$ 2.500 da Tata?
OLIVEIRA
- (risos) Estou curioso para ver esse carro. O brasileiro teve, por muitos anos, acesso à veículos baratos, mas que eram... Eu não gosto do termo...

FOLHA - Carroças?
OLIVEIRA
- É. Carroças, veículos "pé-de-boi". Se os competidores atingirem tudo que oferecemos, criarão um caminho para que todos possamos seguir.

FOLHA - Mas a própria Ford tem estudos para um carro de US$ 7.500.
OLIVEIRA
- Sim. Mas qual é esse patamar? Há um ano, falávamos em US$ 4.000. Hoje tem gente falando em US$ 2.500...

FOLHA - Você tem vontade de voltar para os EUA?
OLIVEIRA
- Para ser sincero, não estou nem um pouco interessado. Mas há o ditado "You never say never" [Você nunca diz nunca]. Tudo pode acontecer...


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