São Paulo, sábado, 25 de outubro de 2008

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BELEZA

NATURAL, ‘PERO NO MUCHO’

Nem sempre o que o marketing vende corresponde à realidade; saiba o que vai dentro dos cosméticos

DANAE STEPHAN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A indústria brasileira descobriu há alguns anos o poder que o apelo natural exerce sobre a venda de cosméticos. A busca por produtos menos agressivos ao organismo e ao ambiente é uma tendência mundial, e seria de se esperar que o Brasil, com sua biodiversidade, fizesse parte desse movimento.
O problema é que, enquanto nos países desenvolvidos esse crescimento se dá por marcas certificadas, muitas orgânicas, por aqui o que mais se vê nas prateleiras são falsos naturais: têm rótulos apelativos, embalagens recicláveis, nomes sugestivos e até ingredientes da Amazônia. Já as fórmulas pouco diferem das convencionais.
Mesmo que contenham os ativos descritos nas embalagens (os extratos de açaí, cupuaçu e pitanga são os da moda), isso não significa que eles sejam naturais. As concentrações de óleos essenciais e extratos naturais são normalmente muito baixas, e o restante da fórmula inclui corantes, conservantes e outros ingredientes que impossibilitam sua classificação como natural.
"Isso quando o "contém frutas vermelhas" do rótulo não se refere ao aroma artificial das frutas, e não ao extrato natural", diz Fernando Lima, dono da Florestas, marca nacional de cosméticos orgânicos.
Estudos alertam sobre a periculosidade de determinadas substâncias largamente usadas em cosméticos. Os mais polêmicos hoje são os parabenos, o triclosan e o lauril sulfato de sódio. O óleo mineral, derivado do petróleo, já esteve na berlinda, mas como as pesquisas nada concluíram, continua sendo usado em óleos de banho e hidratantes, inclusive infantis.
O primeiro especialista a levantar os riscos dessas substâncias foi o médico Samuel Epstein, no livro "Unreasonable Risk" (inédito no Brasil). "Ele considera os parabenos, por exemplo, carcinogênicos escondidos. Ou seja, não provocam câncer, mas estimulam uma divisão celular anômala em indivíduos com predisposição a desenvolver a doença", diz a engenheira química especializada em cosmetologia Sonia Corazza.
As pesquisas na área são esporádicas, e muitos componentes nunca foram estudados a fundo. Outros foram testados em animais, com resultados preocupantes, mas não em humanos. Outros estudos ainda relacionam certas substâncias ao câncer ou a má-formação fetal, mas se usados em doses muito maiores do que a encontrada em cosméticos.
Para fabricantes, isso prova a segurança dos produtos. Para os ativistas, a ciência está desconsiderando um fato importante: eles são usados diariamente, e em grandes quantidades. "Uma pessoa normal usa no mínimo dez cosméticos todos os dias", afirma o professor de cosmetologia Mauricio Pupo, formado pela PUC-Campinas. "Ninguém sabe ao certo o que essa exposição diária pode causar". Os cosméticos que ficam em contato com a pele são ainda mais preocupantes. "Depois de oito horas, 60% dos parabenos são absorvidos. Se o hidratante contiver uréia, essa absorção é potencializada", diz.
Mesmo substâncias reconhecidamente seguras, como o dióxido de titânio (um filtro solar físico), não estão livres de problemas. "Ele é extremamente tóxico, mas, como é usado superficialmente, não representa perigo. Porém, com a nanotecnologia, ele é reduzido a um tamanho que permite sua absorção pela pele", diz Sonia Corazza. "Na dúvida, prefiro os feitos à base de óxido de zinco."
Na esteira das polêmicas, algumas marcas preferem não correr riscos. A recém-lançada Ada Tina é livre de parabenos e óleo mineral, não usa ingredientes sob suspeita pelos principais organismos internacionais e não compra matérias-primas testadas em animais. A linha para bebês Millebolleblu e a Prophyto, da Cosmética, também nasceram com um conceito semelhante. "Os três ingredientes mais reativos são os corantes, os conservantes e as fragrâncias, por isso usamos apenas corantes e aromas naturais, e a menor quantidade possível de conservantes", afirma a química Eliane Dornellas, da Cosmética.
Hoje, essa é também a posição da Natura, que até 2006 tinha todos esses ingredientes em suas fórmulas, inclusive nas maquiagens. "Se há controvérsia e existe um substituto viável, não esperamos um estudo definitivo e fazemos a substituição", diz Marcos Vaz, diretor de serviços técnicos.


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