São Paulo, sábado, 31 de outubro de 2009

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MARIA INÊS DOLCI [defesa do consumidor]

Nas mãos de poucos


Quanto mais concentrado um mercado, menor o poder de fogo do consumidor. Isso é perigoso


LAURA NÃO QUERIA CONCENTRAR todos os seus negócios nas mãos de um mesmo banco. Tinha, então, conta corrente em um e cartão de crédito em outro. Na semana passada, recebeu correspondência da administradora do seu cartão. Uma megafusão havia unido conta corrente com cartão de crédito. Então, ela estava com todos os ovos na mesma cesta.
Isso já havia acontecido quando tinha telefone fixo de uma empresa e banda larga de outra. Pois é, as duas se uniram, e ela dependia de um só fornecedor para dois serviços. Para três, na verdade, porque aquela empresa também respondia por sua assinatura de TV.
Hoje, leitor, leitora, Laura se tornou muito mais cautelosa ao comprar um produto ou escolher um prestador de serviços. Como ocorreram muitas fusões e aquisições, então, pode acontecer de uma marca na qual ela não confia estar por trás de outra, sem que ela saiba.
Os bancos têm juntado seus bilhões, também, e agora estão de olho nas seguradoras. Você, que tinha conta corrente em um, cartão de crédito de outro e seguro de carro de um terceiro, bem, provavelmente vai adquirir os três de um mesmo banco.
Qual o problema, dirão os arautos dos negócios sem limite. Quanto mais concentrado um mercado, menor o poder de fogo do consumidor. É também por isso que em algumas áreas os serviços são tão ruins, como por exemplo telefonia celular, banda larga, TV por assinatura.
A concorrência é um dos pressupostos da economia capitalista. Mas, por aqui, temos assistido ao encolhimento das opções em diversos mercados. Isso é perigoso, também, porque oligopólios (domínio de mercados por grupos de empresas) costumam definir preços com margens de lucro mais encorpadas do que quando o nosso dinheiro é disputado por várias empresas.
A oferta de serviço e o tratamento dispensado aos clientes e às suas reclamações também são afetados pelo domínio de poucos em uma área de negócios. Em alguns lugares do Brasil, por exemplo, há diferenças de centavos, somente, para os preços dos combustíveis em dezenas de postos de abastecimento. Você tem alguma dúvida de que é nesses lugares que gasolina e álcool custam mais caro?
Empresas têm todo o direito de crescer, conquistar mercado e adquirir o controle de outras organizações concorrentes. Faz parte do jogo. Mas, em um país em que o mercado interno ainda está se desenvolvendo, com notório desrespeito aos direitos do consumidor, é uma temeridade que poucos grupos tenham tanto poder sobre áreas fundamentais da economia.
Laura está preocupada com isso. Teme, com razão, ficar nas mãos de alguns poucos fornecedores.
E você, o que acha disso? Podemos ficar tranquilos, ou devemos cobrar mais ação de nossas autoridades? Duvido, contudo, que esse tema seja amplamente debatido na campanha eleitoral do ano que vem. Duvido, e Laura também.


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