Descrição de chapéu iphan

MinC diz não ter verba para recuperar casas do poeta Thiago de Mello

Conteúdo restrito a assinantes e cadastrados Você atingiu o limite de
por mês.

Tenha acesso ilimitado: Assine ou Já é assinante? Faça login

Projetadas pelo autor do plano urbanístico de Brasília, Lucio Costa (1902-1998), duas casas construídas na Amazônia para o poeta Thiago de Mello, 91, estão abandonadas e tomadas por mato e sujeira na cidade de Barreirinha (AM), a 331 km de Manaus.

O prefeito da cidade, Glênio Seixas (MDB), pediu ajuda ao Ministério da Cultura.

A resposta foi uma ducha de água fria. "Considerando o contingenciamento orçamentário do governo federal, esta secretaria não dispõe de recursos para apoio ao referido município", diz o ofício assinado pela Secretaria de Infraestrutura Cultural do MinC em outubro passado.

No documento, o MinC sugeriu à prefeitura que buscasse recursos da União por meio de emendas parlamentares.

À Folha, o MinC reafirmou que "ainda não há previsão de apoio à revitalização da edificação", embora reconheça "a importância do poeta Thiago de Mello e de suas obras e, dentro dos limites orçamentários, tem total interesse em apoiar projeto".

Nascido em Barreirinha, Thiago de Mello mudou-se ainda criança para Manaus e, depois, para o Rio, onde fez amizade com Lucio Costa no final da década de 1940.

Filha do urbanista, a arquiteta Maria Elisa disse à Folha que Thiago era "das raras pessoas" que apareciam na casa de seu pai sem aviso prévio.

"Chegava, se instalava na poltrona, e a conversa fluía sem esforço". Segundo ela, nesses encontros surgiu a ideia de Lucio Costa de projetar, em 1978, três casas para o poeta, que construiu todas.

Na primeira, em Barreirinha, que batizou de Porantim do Bom Socorro, o autor viveu de 1978 a 1992, quando vendeu o imóvel para ao Estado, que depois o repassou para a prefeitura, segundo um de seus filhos, o compositor Thiago Thiago de Mello, 36.

O poeta ocupou a segunda casa, na mesma cidade, até 2005, quando também a vendeu para o Estado. Restou a terceira, em Freguesia do Andirá, ainda hoje em posse da família. As duas primeiras é que estão abandonadas.

"A família do Thiago está fazendo um tremendo esforço para salvar as casas. Acho incrível como o Ministério da Cultura não percebe que a casa não é um 'projeto menor' de Lucio", disse Maria Elisa.

O filho de Thiago afirmou que a alta qualidade da madeira usada nas construções, a itaúba preta, tem permitido aos imóveis "resistir a todos esses anos de abandono".

"Essas casas de Barreirinha têm um valor arquitetônico incrível. Receberam visitantes do mundo inteiro e transformaram a vida das pessoas de Barreirinha que as frequentaram", disse o filho do escritor.

Segundo ele, a família pretende obter, por meio do Instituto Thiago de Mello, tocado pela família, o tombamento dos imóveis pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).

'OITO DO GLÓRIA'

Thiago de Mello era adido militar da embaixada brasileira no Chile quando ocorreu o golpe militar de 1964. De volta ao Brasil, foi preso e viveu no exílio de 1969 a 1977. No retorno ao Brasil, decidiu viver na sua cidade natal.

Com a morte, no último dia 5, do escritor Carlos Heitor Cony, Thiago passou a ser o último remanescente do grupo que ficou conhecido como Os Oito do Glória, na verdade nove intelectuais e artistas que foram presos pelos militares no Hotel Glória, no Rio, em novembro de 1965.

Eles fizeram um protesto contra a ditadura durante uma reunião da OEA (Organização dos Estados Americanos) no hotel: além de Cony e Thiago, o escritor Antonio Callado, os cineastas Glauber Rocha e Joaquim Pedro de Andrade, o diretor de teatro Flávio Rangel, o diretor de fotografia de cinema Mário Carneiro, o jornalista Márcio Moreira Alves e o embaixador Jaime Azevedo Rodrigues.

Thiago de Mello é considerado um dos principais poetas em atividade no país. Em 1975, o escritor recebeu o prêmio da Associação Paulista dos Críticos de Arte pelo livro "Poesia Comprometida com a Minha e a Tua Vida".

Em 2013, ao visitar uma das casas acompanhado pela Folha, o poeta ficou contrariado ao ver que a biblioteca tinha sido destruída com o passar do tempo. "Demoliram a biblioteca em que trabalhei! Demoliram!", disse à época.

Relacionadas