Angustiante, 'Hereditário' resgata o verdadeiro filme de terror
Em sua estreia em longas, diretor Ari Aster passa longe dos clichês do gênero
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É hora de esquecer os filmes de terror exibidos nas últimas décadas. Os bons e os ruins, tanto faz. "Hereditário", certamente uma das experiências cinematográficas mais intensas desta temporada (e de muitas outras), resgata o verdadeiro filme de terror. Aquele capaz de congelar a plateia.
Em sua estreia em longas, Ari Aster passa longe dos clichês do terror. Sem banho de sangue, sem sustos, sem personagens morrendo um a um como fases de um game.
É uma ofensa comparar "Hereditário" a "A Hora do Pesadelo", "Pânico" e imitações pioradas dessas franquias. Ele deve ser catalogado na mesma prateleira de "O Bebê de Rosemary" (1968), "O Exorcista" (1973), "Carrie, a Estranha" (1976) e "O Iluminado" (1980).
O enredo sobre uma família que coleciona tragédias é desenvolvido de modo que o espectador não fique temeroso com o que acontecerá aos amaldiçoados personagens. O roteiro é como areia movediça. Quem assiste ao filme vai sendo lentamente puxado para um poço de sofrimento.
Além de ótimo roteiro e da engenhosa construção de um ambiente angustiante, "Hereditário" até exagera na excelência do elenco.
Toni Collette está arrebatadora como a mãe, Annie, carregada de culpas e traumas de sua relação com os pais mortos. São antológicas as cenas em que ela surta num grupo de autoajuda e quando despeja suas mágoas num jantar caseiro.
Gabriel Byrne, outro veterano de talento sólido, é Steve, que segura durante boa parte da trama a perplexidade diante dos acontecimentos sobrenaturais que assolam sua família. Vai seguir tentando ser a alternativa sensata para o que pensa ser delírio depressivo da mulher.
E os dois jovens que interpretam os filhos atormentados são escolhas muito felizes. Alex Wolff, 20, também músico e diretor de curtas, faz o sensível Peter, o filho mais velho, que receberá a carga mais pesada de dor e provação. Em alguns momentos, o espectador duvidará de quanto mais ele pode aguentar.
A caçula, Charlie, é interpretada por Milly Shapiro, 15, num trabalho brilhante, comparável ao de Sissy Spacek em "Carrie, a Estranha".
Quando a plateia já estiver sentindo muita pena de suas dificuldades para se adequar ao mundo, aí, sim, seu verdadeiro inferno vai começar para valer.
"Hereditário" é tão inusitado, tão inteligente, que não vale a pena discutir muito a trama antes de ir a uma sessão.
As surpresas vão surgindo, até uma conclusão com elementos completamente inesperados. Com ele, o cinema de terror volta a ser como era há quase 40 anos.
Ainda bem.