Chefe da GE na América Latina é preso em operação contra fraude na Saúde do Rio

Há também mandados de prisão contra três executivos da Philips

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Italo Nogueira
Rio de Janeiro

O principal executivo da General Electric para a América Latina, Daurio Speranzini Junior, foi preso temporariamente nesta quarta-feira (4) na Operação Ressonância, que investiga fraudes em licitações na Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro e no Into (Instituto Nacional de Traumatologia) desde 1996.

A investigação é um desdobramento da Operação Fatura Exposta, que prendeu o ex-secretário de Saúde Sérgio Côrtes em abril de 2017. Ela aponta fraudes em licitações da Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro e no Into (Instituto Nacional de Traumatologia) desde 1996.

O pedido de prisão menciona principalmente fatos relacionados ao período em que ele esteve à frente da Philips Medical no Brasil, até 2010. A Procuradoria cita, contudo, caso ocorrido após ele assumir cargo na GE.

Há ainda um mandado de prisão temporária contra outro executivo da Philips do Brasil à época dos fatos investigados: o então gerente Frederik Knudsen. 

A GE não foi alvo de mandado de busca e apreensão. 

O CEO da GE, Daurio Speranzini, um dos alvos desta operação Ressonância, que investiga fraude na Saúde no Rio, chega à sede da PF em SP após ser preso - Aloisio Mauricio /Fotoarena/Folhapress

Outra grande multinacional sob investigação é a Johnson & Johnson. O Ministério Público Federal chegou a pedir busca e apreensão na sede da companhia no país, mas ela não foi autorizada pela Justiça. ​

Há ainda um mandado de prisão contra outro executivo da Philips do Brasil à época dos fatos investigados: o gerente Frederik Knudsen. 

Além da própria Philips, estão na mira dois executivos da Dixtal Biomédica, empresa adquirida pela multinacional holandesa no Brasil.

O Ministério Público Federal aponta como o responsável por "disseminar as práticas criminosas" na firma holandesa o ex-sócio da Dixtal Albert Holzhacker, também alvo de mandado de prisão.

Um dos alvos da operação é o empresário Miguel Iskin, que já havia sido preso na Fatura Exposta, e solto em dezembro por decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal). Ele é apontado como um organizador do cartel de pregões internacionais na pasta e no Into desde 1996.

De acordo com as investigações, Iskin cobrava um "pedágio" de 13% sobre os valores de contratos para fornecimento de próteses e órteses. A comissão cobrada para empresas internacionais chegava a 40%, segundo o Ministério Público Federal.

Grande parte das informações sobre a atuação da Philips no Brasil foi obtida por meio do depoimento de um ex-funcionário da companhia.

Ele era funcionário da Dixtal quando foi adquirida pela empresa holandesa. Segundo a Procuradoria, a testemunha relatou ao setor de compliance as fraudes organizadas por Iskin, sem que a empresa tomasse qualquer atitude para evitá-las.

"A conivência de executivos da Philips nas práticas criminosas restou evidenciada pela reação da empresa diante das denúncias, o que, à época, gerou apenas a intervenção administrativa da multinacional junto ao Ministério da Saúde para retirada do nome da sociedade do contrato firmado em decorrência da licitação, sem que fosse apontado o sobrepreço ao referido órgão ou rescindido o contrato firmado com a empresa Rizzi [representante comercial]", afirma o MPF.

A testemunha acabou demitida da Dixtal e recontratado pela Philips num cargo de menor nível, segundo o MPF. A Procuradoria afirma ainda que Sperazini Junior foi demitido em 2010 "após investigação interna".

O executivo foi contratado pela GE no ano seguinte como gerente-geral de sistemas de saúde. Foi promovido a vice-presidente comercial e executivo-chefe para a América Latina, antes de chegar ao posto de CEO (equivalente a diretor-executivo) no continente.

A Procuradoria afirma que Speranzini Junior "permaneceu realizando as contratações espúrias com o poder público" no cargo da empresa norte-americana. O pedido de prisão inclui um email no qual é discutido a dificuldade na entrega e validação de um equipamento móvel de saúde. Há poucas informações sobre o caso. A petição não deixa clara qual a suspeita sobre o negócio.

A Johnson & Johnson, por sua vez, é suspeita de ter participado do cartel até 2014. Após rompimento de acordo de representação com Iskin, a empresa passou a sofrer represálias e foi desclassificada de todas as licitações para fornecimento ao Into em que participou em 2015 e 2016.

A estrutura do cartel foi detalhada por duas empresas em acordo de leniência com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). Foram listadas ao Cade 70 licitações afetadas pelo cartel, com o envolvimento de 37 empresas.

O dono da leniente Per Prima, Leandro Carmago, afirmou que a lista de compras no Into era feita de acordo com as prioridades de Iskin, e não das necessidades do hospital. A estimativa, considerada conservadora, é de que os danos aos cofres públicos tenham chegado a R$ 600 milhões.

Outro elemento da investigação é a delação premiada do ex-subsecretário de Saúde César Romero, que também originou a Fatura Exposta. Em depoimento, ele detalhou o cartel que foi adotado na Secretaria de Saúde. O colaborador mencionou 18 multinacionais do setor de saúde.

OUTRO LADO

Em nota, a GE afirmou que a empresa não é alvo das investigações e que está à disposição para colaborar com as autoridades.

"A respeito da operação da Polícia Federal conduzida na manhã de hoje, que resultou na prisão temporária de Daurio Speranzini Jr., esclarecemos que as alegações são referentes ao período em que o executivo atuou na liderança de outra empresa", diz o comunicado. 

Por meio de sua assessoria de imprensa no Brasil, a Philips informa que "ainda não teve acesso ao processo, no entanto, está cooperando com as autoridades para prestar quaisquer esclarecimentos quanto às alegações apresentadas, que datam de muitos anos atrás".

"Os atuais líderes executivos da Philips não são parte da ação da Polícia Federal; um colaborador da equipe de vendas da Philips foi conduzido para prestar esclarecimentos", afirma em nota. 

A Johnson & Johnson Medical Devices Brasil diz que segue rigorosamente as leis do país e está colaborando integralmente com as investigações em andamento.

A reportagem tenta contato com representantes de outros investigados. 

 
 

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