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Moradores das favelas do Rio criticam falta de legado da Olimpíada

Maria da Penha Batista, 62, vive a um quilômetro da arena onde acontecerão os jogos de vôlei de praia da Rio-2016, mas, na semana anterior ao início das competições, nem sequer sabia disso.

Ela mora na favela da Babilônia, no Leme, de onde se avista toda a praia de Copacabana, por onde passarão atletas de quatro modalidades —vôlei de praia, ciclismo de estrada, maratonas aquáticas e triatlo.

Falar de Olimpíada lhe faz lembrar que ela deveria estar morando em um prédio do programa de urbanização de favelas apresentado pela prefeitura como legado olímpico, o Morar Carioca.

Batista, no entanto, vive num casebre em terreno onde há risco de deslizamento de terra quando chove.

Cada área que receberá competições tem casos como esse —moradores de favelas próximas às arenas que se sentem excluídos de uma cidade olímpica.

A Folha visitou dois exemplos, além da Babilônia: a Mangueira, a um quilômetro do Maracanã, sede do futebol e da abertura, e a Cidade de Deus, a sete quilômetros do Parque Olímpico da Barra.

"Eles não querem integrar a favela à cidade, querem nos isolar", diz Sérgio Leal, 44, conhecido como DJ TR, morador da Cidade de Deus desde que nasceu. "Vão cercar a gente de forças de segurança e nos sitiar."

Como ele, moradores das favelas visitadas pela reportagem demonstram insatisfação com a política de UPP (Unidade de Polícia Pacificadora), implementada pelo poder público com o impulso de Copa do Mundo e Olimpíada.

Os Jogos Olímpicos acontecerão em um momento em que essa política está em xeque. Relatório do Instituto de Segurança Pública divulgado nesta sexta (29) mostra aumento de homicídios e roubos no mês de junho comparado ao ano passado.

Moradores criticam a falta de preparo de alguns policiais das UPPs e a ausência de serviços sociais básicos.

Militares fazem a segurança do Maracanã, mas, na Mangueira, a reportagem foi aconselhada pela associação de moradores a não subir o morro devido a um tiroteio.

"Estamos naquela situação de 'tão perto, tão longe'", diz Thiago Santana, 31, vice-presidente da associação de moradores da Mangueira.

"A polícia não quer uma faísca durante a Olimpíada, então vai usar todo o poder ostensivo que puder, mas sabemos que é momentâneo."

SEM LEGADO SOCIAL

Na Babilônia, foram construídos, no âmbito do Morar Carioca, dois conjuntos habitacionais na parte baixa da favela, mas o terceiro não saiu do papel.

A prefeitura diz que o programa não pôde acomodar a todos por "dificuldades no processo de desapropriação" e porque, por exigência do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), prédios tiveram que ser construídos com três andares, e não quatro.

Maria da Penha recebeu convite para ir a um conjunto habitacional em Santa Cruz, a 65 quilômetros do morro onde vive há 26 anos e que não quer deixar.

Além da falta de legado social dos Jogos para as favelas, os moradores questionam também a oportunidade esportiva desperdiçada.

O boxeador Isac Silva, 32, que improvisou uma academia na laje de uma igreja evangélica na Cidade de Deus para treinar crianças e adolescentes, tem uma visão dicotômica sobre o impacto da Olimpíada na comunidade.

"Como morador, não significa nada. Como professor, acho bom para abrir a cabeça dos pais para o fato de que esporte não é só futebol. A Olimpíada vai tornar tudo isso mais visível."

Silva vai assistir às lutas de boxe em casa, pela televisão.

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