Prêmio Folha Categoria Reportagem 1996
'Não aceitamos a palavra cessar-fogo'


21/04/96
Editoria: MUNDO
Autor: IGOR GIELOW


O Hizbollah (Partido de Deus) vai manter sua luta contra Israel até a desocupação do sul libanês pelas tropas de Shimon Peres, independentemente de um cessar-fogo _que estava sendo negociado ontem em Damasco.
"Nós não aceitamos a palavra cessar-fogo. Israel é o agressor que age em área libanesa como se fosse sua'', disse à Folha um dos cinco principais líderes do Hizbollah, o deputado Nauaf Mussaui, 34.
Ele falou dentro do centro de comunicações do Hizbollah na região de Haret Rerek, sudeste de Beirute. O local é uma das sedes do grupo, que também é um partido político com 12 deputados no Parlamento libanês.

Barreiras
Para chegar à sede, é preciso passar por barreiras do Exército do Líbano, do Exército da Síria (que mantém tropas em Beirute) e, por fim, pelos sentinelas do Hizbollah.
O bairro de Haret Rerek tem crianças brincando na rua e comércio ativo, mas a condição de alvo preferencial de ataques israelenses mantém uma tensão visível.
Abordados na rua, os moradores dizem não saber a localização de nenhum prédio do Hizbollah. Isso em frente ao portão e à barricada que protege a casa permanente do aiatolá Fadlallah _líder espiritual máximo do grupo.

Simplicidade
A sede visitada pela Folha é simples, com cartazes do aiatolá Khomeini, ideólogo do fundamentalismo islâmico, pela parede.
A sala onde despachava o xeque Abbas Mussaui tem placas de homenagem na parede. Ele era o líder do Hizbollah até fevereiro de 1992, quando foi morto em um ataque da aviação israelense, no qual também morreram sua mulher e filho.
Nauaf Mussaui, entrevistado ontem, disse ser seu parente, mas não em que grau. Ele é um dos deputados do Hizbollah e integra o conselho político, uma entidade quase secreta que define métodos de atuação do grupo.
Segundo Mussaui, o conselho tem "pouco mais que uma dezena de membros''. Ele faz parte dos cinco integrantes mais poderosos.
Mussaui, que ostenta barba bem-aparada e usa óculos, responde falando um árabe pausado, traduzido por seu secretário e primo Ibrahim Mussaui.
Leia a seguir a entrevista, concedida entre 13h e 13h40 de ontem (7h e 7h40 em Brasília):

Folha - O que o sr. acha das propostas que estão sendo negociadas para o cessar-fogo?
Nauaf Mussaui - Em primeiro lugar, nós não aceitamos a palavra cessar-fogo. Israel é o agressor e age em uma área libanesa. Cessar-fogo é uma palavra que lembra igualdade de forças, e isso não ocorre.
Mas nós vamos parar de atirar se eles pararem. Ninguém quer violência. Para conseguir votos numa eleição, (o premiê de Israel) Shimon Peres colocou corpos de civis nas urnas.
Nós não queremos violência, mas também não vamos parar de lutar até que Israel saia do território libanês.

Folha - Até com o uso de suicidas?
Mussaui - Nossa missão nos obriga a usar todos recursos.

Folha - O Hizbollah aceitaria um acordo por escrito?
Mussaui - Não vamos assinar nada, não vamos legitimar a ocupação do sul do Líbano. Queremos, isso sim, garantias de que Israel não vai mais atacar civis e matar gente em ambulâncias e refugiados. Israel tem que ser condenado.

Folha - Longe de um acordo formal, não se dificulta a paz?
Mussaui - Nós temos o direito de resistir e isso não se discute.
Desde julho de 1993, quando fizemos o primeiro acordo, até 30 de março deste ano, Israel violou 231 vezes os termos concordados. Morreram 69 civis libaneses e 365 ficaram feridos. Perderam a casa 631 pessoas, e nós ajudamos a reconstruir.
Respondemos com Katiuchas a 18, matando 2 israelenses e ferindo 41. Lembre-se, é Israel que ocupa o sul do Líbano.

Folha - Falando em Katiuchas, como eles chegam a vocês?
Mussaui - (risadas e comentários em árabe; todos sabem que elas vêm do Irã via Síria) É difícil falar sobre isso. Estamos em guerra e a busca de assistência é válida.

Folha - Na hipótese da saída de Israel da zona de segurança, qual será a relação entre o Hizbollah e governo de Rafik Al Hariri?
Mussaui - O Hizbollah, embora todos achem que é um perigoso grupo de extremistas, é um partido político e lidera boa parte do povo libanês.
Veja o que aconteceu hoje nas ruas aqui perto (refere-se à distribuição, pelo Hizbollah, de colchões vindos da Síria para refugiados do sul do país). Somos nós trabalhando.
Temos papéis assistenciais, na área de saúde, cultura e educação.
E temos 12 deputados (a Assembléia Nacional tem 128 ao todo). Isso nos faz importantes dentro do mapa político do país.


Leia mais
Hizbollah atrai ataques a bairros pobres


Prêmio Folha

Conflito no Líbano

Conexão Manágua

Mercado de Voto

Segredos do Poder


Educação

Folha revela como empreiteiras e bancos financiaram o jogo eleitoral

Fotos e documentos derrubam versão oficial do caso PC

Prêmio Folha Categoria Fotografia
Pátria armada
Dia de terror
São Paulo de patins
Tentativa de assalto
PC no IML
Socorro. Polícia
Miragem
Garimpeiros do lixo



Veja todos os vencedores dos anos anteriores
1999

1998

1997

1996

1995

1994

1993

subir

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A - Todos os direitos reservados.