Quando
a cidade souber desse projeto, muitos paulistanos irão
sair caçando as orquídeas desperdiçadas
A Argentina Adriana Irigoyen está fazendo surgir um
hobby ecológico na cidade de São Paulo: o de
"reciclador de orquídeas". O resultado dessa
mania só será visto, porém, no próximo
ano no canteiro da avenida 9 de Julho -e isso não é
nenhuma espécie de tributo poético à
Revolução de 1932, comemorada hoje. "Vamos
fazer daquela avenida a rota das orquídeas."
A história dessa tribo paulistana começa com
a admiração de Adriana pela arquitetura moderna,
tema de seu mestrado na USP. Para seu supremo prazer, ela
foi morar num prédio da avenida 9 de Julho projetado
por Rino Levi, o expoente da moderna arquitetura brasileira.
Para sua tristeza, contudo, o prédio estava repleto
de problemas de conservação. "Essa combinação
de prazer com aborrecimento me levou a aceitar o cargo de
síndica."
Como tem apreço pelas causas ecológicas -para
evitar a poluição, costuma andar a pé-,
Adriana criou, no prédio, a coleta seletiva de lixo.
Ela notou que, depois das festas, as orquídeas eram
jogadas fora, quando poderiam ser reutilizadas desde que replantadas.
"As pessoas têm preguiça de replantar a
orquídea ou não sabem fazê-lo, afinal
isso exige certa técnica."
Naquela mesma época, ela tinha se envolvido no plantio
de árvores no canteiro da
avenida 9 de Julho, quando conheceu o advogado Paulo Visani
Rossi, seu vizinho. "Fiquei entusiasmado com essa idéia
de salvar as orquídeas", conta Paulo, que fez
contato com uma empresa de festas que costumava descartar
aquelas flores -desde o começo do ano, o condomínio
recebeu por mês 60 mudas só dessa empresa.
Foi um contato estratégico para o projeto. Paulo já
vinha desenvolvendo para empresas projetos de melhoria de
espaços públicos, especialmente de jardins públicos.
Sabia que, se houvesse doações, o gasto seria
baixo. "Seria apenas o custo do jardineiro."
Rapidamente, outros vizinhos começaram a fazer a
coleta de orquídeas para replantá-las. Os vizinhos
passaram a envolver os síndicos, que, por sua vez,
contataram os jardineiros de seus prédios. Mais gente
se dispôs a plantar as mudas. Adriana aposta que, quando
a cidade souber desse projeto, muitos paulistanos irão
sair caçando as orquídeas perdidas, desperdiçadas
nas centenas de festas.
Sua satisfação íntima, a ser desfrutada
apenas no próximo ano, é a vista mais bela de
seu apartamento -é como se ela própria interferisse
na paisagem composta por Rino Levi, num tributo à arquitetura
moderna.
Coluna originalmente
publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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