REFLEXÃO


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urbanidade
15/10/2008

Concerto na rua

Eles querem sair viajando por todo o Brasil, levando Bach, Mozart e Vivaldi para as ruas, no estilo circo mambembe

Ao contrário dos estudantes de música erudita, Caio Cezar Monteiro Gomes, 20, não tem o projeto de tocar sua viola numa sala de concertos silenciosa, com acústica impecável. Optou pela poluição sonora. "Eu quis levar a música erudita para a rua." Literalmente. Fez da avenida Paulista seu palco e dos pedestres, a audiência. E, por enquanto, está conseguindo sobreviver, à base da bilheteria espontânea. "Muita gente confunde a bilheteria espontânea com esmola, mas é uma forma de patrocínio para continuar oferecendo cultura na rua, a quem jamais ouviria Mozart ou Bach."

Caio tocava música erudita com mais quatro amigos em Santos, onde moravam até o ano passado -além de sua viola, dois violinos, um violoncelo e percussão. Decidiram subir a serra do Mar e tentar a sorte em São Paulo. "A imagem que tínhamos da cidade era péssima, só conflitos, trânsito, violência, gente estressada." O medo aos poucos foi desaparecendo e eles descobriram que, por trás de muitos daqueles estressados e apressados, havia gente disposta a parar alguns minutos para apreciar o som estranho de um violoncelo.

O quarteto do Concerto de Rua

"Muitas pessoas nunca tinham visto pessoalmente um violino." A poluição sonora, aos ouvidos deles, era compensada com o encanto da "platéia" diante do "Concerto de Rua", o nome do grupo.

Ouça o Concerto de Rua

A bilheteria espontânea não só dá para pagar as contas -dividem um pequeno apartamento transformado em república estudantil- como permite que eles possam até mesmo contratar professores que os ajudem a se aprimorar. "Eu até toco de vez em quando numa orquestra para não perder a prática, mas meu som está mesmo na calçada."

Mas a calçada também se transformou num escritório. Eles vêm conseguindo fechar contratos de casamentos, batizados e festas de confraternização. Tiveram, então, de adaptar o repertório, encaixando MPB, especialmente bossa nova, mas sempre com o toque erudito.

Mas o que eles querem mesmo é fazer da avenida Paulista uma base de lançamento para um projeto mais amplo. Querem sair viajando por todo o Brasil, levando Bach, Mozart e Vivaldi para as ruas, no estilo circo mambembe. Torcem para que, um dia, entre os seus espectadores, apareça um patrocinador -muitos deles, afinal, trabalham na avenida Paulista.

Enquanto o patrocinador não vem, o "Concerto de Rua" prepara seu primeiro CD, que, obviamente, será vendido na rua.

Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.

   
   
 
 

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