O
emprego está nas micros
Uma detalhada
radiografia do mundo do emprego no Brasil feita recentemente pelo
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)
mostrou em números o que muitos economistas vinham pressentindo
há algum tempo. A pesquisa revela os efeitos da combinação
do aumento da produtividade com a desaceleração da
economia brasileira. Hoje as empresas fazem mais com menos empregados.
Quando se soma
a isso a retração da economia, o resultado é
o que a pesquisa estampa: o número médio de empregados
nas companhias brasileiras caiu 15% em comparação
com o mesmo indicador de cinco anos atrás. A reestruturação
da economia, conforme aponta o estudo do BNDES, levou o foco da
geração de empregos para as chamadas microempresas
- lojas, fábricas, bares e confecções com até
dezenove funcionários. Esse segmento emprega atualmente 53%
de toda a força de trabalho no Brasil com carteira assinada
- contra 46% em 1995.
Dados recentes
mostram que os estabelecimentos brasileiros que usam mão-de-obra
intensiva, as grandes empresas industriais, foram as companhias
que mais se esmeraram em obter ganhos de eficiência na última
década. Entre as cinco primeiras da lista, quatro estão
ligadas à indústria de transportes, que, na década
de 90, enxugou 22% de suas vagas. Segundo os especialistas, o rearranjo
da economia brasileira em função do aumento da produtividade
começa a dar sinais de estabilização. "O
choque de reestruturação produtiva completou-se no
Brasil. Agora é hora de crescer", diz Luiz Parreiras,
economista do Ipea.
O trabalho do
BNDES listou as típicas empresas que compõem o heterogêneo
cenário das microfirmas brasileiras e as colocou num ranking.
Entre as que apresentam o menor quadro de funcionários estão
clínicas veterinárias, postos de gasolina, açougues,
brechós e auto-escolas. Por princípio, não
é ruim que as microempresas tenham um peso tão elevado
na estrutura produtiva de um país. Nos Estados Unidos e em
países europeus, elas são tradicionais alavancadoras
de emprego.
Uma característica
típica do Brasil nesse setor torna a realidade mais árdua
do que em outros países. As microempresas brasileiras têm
mais dificuldade de sobreviver. De acordo com uma estatística
recente, metade delas fecha as portas antes de completar quatro
anos de vida. Em um país como o Brasil, em que 93% dos estabelecimentos
são micros, isso é preocupante.
Nos Estados
Unidos, esse número não é tão diferente:
87% das firmas são micros. A diferença é que
boa parcela dessas empresas americanas prospera, portanto cresce
e passa a gerar mais empregos. Esse dinamismo, embalado por taxas
de crescimento econômico na casa dos 4%, ajuda a explicar
por que a média de empregos gerados numa companhia americana
subiu no mesmo período em que, no Brasil, ela caiu. Aqui
não houve crescimento econômico comparável ao
americano.
Por trás
da queda no número de empregados nas firmas brasileiras está
também o acirramento da competição. Elas passaram
a precisar elevar sua produtividade às alturas, usando mais
tecnologia e menos mão-de-obra. A modernização
da indústria de transformação podou mais de
meio milhão de vagas na década de 90. As grandes empresas
brasileiras adotaram a estratégia da terceirização,
cuja idéia é ganhar produtividade, concentrando-se
na fabricação de carros ou aviões, e pagar
outras empresas para lhes prestar serviços.
A reestruturação
levou ao emagrecimento do quadro das grandes companhias e fez nascer
outras menores que gravitam em torno das gigantes. Isso contribuiu
para a diminuição do número de empregados por
estabelecimento brasileiro, como mostra o estudo do BNDES. A economia
brasileira passou na última década pelo mesmo processo
vivido há vinte anos nos Estados Unidos. "O Brasil se
encontra num estágio anterior ao americano em sua reestruturação
capitalista. Os Estados Unidos já estão na fase 2",
observa a economista Sheila Najberg, autora do estudo e gerente
executiva na área de emprego do BNDES.
Os índices
de desemprego no Brasil nunca foram altos em comparação
com os de economias mais maduras. Na década de 80, os desempregados
equivaliam a 5% da força de trabalho. Hoje, a taxa quase
dobrou: está em 9,4%. A tendência à redução
das vagas no mercado de trabalho em conseqüência do ganho
de eficiência na produção não é
um problema exclusivamente brasileiro. Aconteceu no mundo inteiro.
A questão no Brasil se complicou porque a economia vem patinando
em taxas de crescimento medíocres.
(Veja - 27/01/03)
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