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15/10/2007
Falta quem queira ser professor

Há formados em Licenciatura para suprir demanda, mas eles optam por outros empregos


Mais de 70% dos formados em Licenciatura no País não trabalham como professores nas escolas brasileiras. Estudo inédito feito pelo Ministério da Educação (MEC) mostra que, com exceção das áreas de física e química, existem mais licenciados do que a demanda para dar aulas em todas as salas de 5ª a 8ª série e do ensino médio.

Cerca de 1,2 milhão se graduaram como potenciais professores nos últimos 25 anos e o crescimento nesse contingente desde 2001 foi de 66%. Mas eles não querem ir para as salas de aula.

A valorização da profissão, que comemora hoje seu dia, minguou com a expansão de estudantes nas escolas públicas brasileiras na última década. Em julho, o Conselho Nacional de Educação (CNE) chegou a divulgar um estudo que falava em “apagão” de professores, já que o País teria uma déficit de 246 mil profissionais.

A pesquisa do MEC, agora, mostra números diferentes. A demanda para cobrir todas as escolas de 5ª série ao ensino médio do Brasil é de 725.991 docentes e há 1,4 milhão em exercício. “Havia incorreções no estudo do CNE, não faltam professores e sim faltam professores licenciados para as áreas específicas”, diz o diretor do Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais do MEC (Inep), Dilvo Ristoff.

Ou seja, há profissionais formados em outras áreas ou mesmo professores de disciplinas diferentes dando aulas nas salas que estariam abandonadas. Em Física e Química existem, respectivamente, 6 mil e 8 mil professores licenciados, mas são cerca de 60 mil trabalhando em cada uma das áreas. Portanto, cerca de 90% de quem ensina essas disciplinas não tem a formação adequada para isso.

“O profissional de física contraria a lei da oferta e da procura. Somos poucos, mas continuamos ganhando mal”, diz o professor das redes estadual e municipal de São Paulo, Tomé Ferraz, de 49 anos. Ele dá 365 aulas por mês - pela manhã, à tarde e à noite - e recebe cerca de R$ 3 mil. Se esforça ainda para concluir um mestrado na Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) sobre história da ciência. “Tenho o sonho de um dia sobreviver dignamente da minha profissão.”


Respeito

Em Educação Física só 32 mil dos 63 mil que dão aulas fizeram Licenciatura na área. Mesmo assim, há um total de 195 mil formados nos últimos anos trabalhando longe do ensino básico. Rogério Rabello, de 30 anos, terminou a graduação em Educação Física, com licenciatura e bacharelado, em 2003, e nunca deu aulas em escolas. “A responsabilidade em trabalhar com crianças é muito grande e a remuneração é baixa”, diz ele, que atua como personal trainner. “Além disso, na academia somos mais respeitados.”

O trabalho de professor para profissionais com nível superior é permitido por uma resolução do CNE, de 1997. Eles devem participar de programas especiais de formação pedagógica para atuar em escolas.

Mas há ainda professores de áreas próximas que quebram galhos. André Luiz Avanci da Rocha tem licenciatura em Química, mas já deu aulas de Física no início da carreira por falta de professor. “Você não se aprofunda muito nos assuntos e tem dificuldade para responder as perguntas dos alunos”, conta.

Fracasso
“As pessoas não querem mesmo trabalhar em um lugar que é um fracasso”, diz a secretária de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar. Para ela, a valorização do professor depende da maior qualificação da escola, o que, segundo ela, é o foco do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), lançado pelo governo neste ano.

O diretor executivo do movimento Todos pela Educação e também um dos responsáveis pelo estudo do CNE, Mozart Neves, diz que, apesar dos novos números do MEC, não se pode dizer que não haja falta de professores no Brasil. “Pode ser que o déficit de 246 mil tenha sido superestimado, mas está claro nas escolas que não há professor suficiente”, afirma.

“Temos notícias freqüentes de que alunos de ensino médio ficam sem aulas em São Paulo”, completa a professora da pós-graduação em psicologia da educação da PUC-SP, Maria Regina Maluf. A Secretaria de Estado da Educação informou, por meio de nota, que não há falta de professores na rede pública estadual.


Renata Cafardo
O Estado de S.Paulo.