São Paulo, domingo, 13 de maio de 2001


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Certificadora brasileira permite uso de resíduo industrial como fertilizante

Orgânico brasileiro pode não ser tão natural assim

DA REDAÇÃO

Quem compra alimentos orgânicos no Brasil achando que está livre de consumir agrotóxicos deve ficar atento, mesmo que o produto tenha o selo de uma entidade certificadora. Pelo menos uma delas, a AAO (Associação de Agricultura Orgânica), admite que seus produtores utilizem um fertilizante feito a partir de resíduos industriais.
"No cultivo de café, permitimos a utilização do Ajifer, mas em pequena escala", diz Alessandra Toledo, coordenadora técnica de inspeção e certificação da AAO.
O Ajifer é um subproduto da fabricação do glutamato monossódico Ajinomoto. Alessandra admite que o uso do fertilizante impede que o selo da AAO seja aceito na União Européia e nos EUA. Das sete certificadoras brasileiras ouvidas pela Folha, só a AAO permite seu uso.
"Já alertamos a AAO sobre o fato de que o Ajifer não deve ser usado em agricultura orgânica", diz Alexandre Harkaly, vice-presidente do IBD (Instituto Biodinâmico), uma das certificadoras que proíbem sua utilização.
O IBD tem 2.700 produtores certificados e é credenciado pela Ifoam (Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica, na sigla em inglês), o que permite que seus produtos sejam aceitos na União Européia, nos EUA e no Japão.
Segundo Douglas Harada, coordenador da certificadora Fundação Mokiti Okada, o Ajifer tem uma grande quantidade de nitrogênio amoniacal. "Proibimos por causa da alta solubilidade do nitrogênio."
Segundo a assessoria de imprensa da AAO, que tem 400 produtores certificados ou em processo de certificação, a organização procura oferecer alternativas ao produtor. "Só permitimos o uso de Ajifer por aqueles que comprovem a necessidade de usá-lo e, mesmo assim, de forma bastante limitada. O uso deve se restringir a 1.500 litros por hectare por ano", diz Isabel Garcia, assessora de imprensa da entidade. "Essa permissão será revista na terceira versão das normas da entidade, que está sendo elaborada."
O Ministério da Agricultura deve lançar um selo nacional de orgânicos. Para isso, criou o Colegiado Nacional de Produtos Orgânicos em 99 e está implantando colegiados regionais para avaliar e instrumentalizar entidades que queiram ser certificadas.
Marcelo Laurino, coordenador do Órgão Colegiado de Agricultura Orgânica do Estado de São Paulo, diz que a questão de o Ajifer ser ou não um fertilizante químico é discutível.
"Não há nenhuma restrição específica ao Ajifer na instrução normativa nº 007 (de 1999), que rege a produção de orgânicos, mas ela tem de ser revista para estar de acordo com as normas internacionais. O Codex Alimentaris [da FAO (Organização de Alimentação e Agricultura da ONU, na sigla em inglês)" não permite a utilização do fertilizante", diz.

Produção baixa
No Brasil, os registros oficiais de produção agrícola não diferenciam alimentos orgânicos de convencionais. Segundo um estudo publicado neste ano pela Ifoam, a área cultivada com orgânicos no Brasil é de 100 mil hectares, ou 0,04% da área total.
A produção está longe da de países como Argentina (3 milhões de hectares, ou 1,77% da área total cultivada, segundo o estudo), Itália (958.687 hectares, ou 6,46%), EUA (900.000 hectares, ou 0,22%) ou Alemanha (452.279 hectares, ou 2,64%).
Segundo Harkaly, do IBD, o principal motivo da diferença é a falta de incentivos oficiais. "As instituições de desenvolvimento da agricultura estão completamente alienadas da vontade do consumidor. Não se financia o período de conversão", diz.
Um dos requisitos para a certificação é um período de conversão, de até três anos, para "limpar" resíduos de agrotóxicos. Quem arca com os custos é o produtor, já que linhas de crédito preferencial, como o Pronaf, do Banco do Brasil, exigem que o produtor seja certificado. "As regras de crédito são ditadas por normas do Banco Central, que não tem nada a ver com o ministério, mas já estamos discutindo com o Banco do Brasil incentivos para o período de transição", diz Rogério Dias, coordenador do Colegiado Nacional de Produtos Orgânicos.
O Ministério do Desenvolvimento Agrário, porém, estimula a produção orgânica entre os agricultores familiares e assentados da reforma agrária: R$ 25 milhões serão direcionados neste ano para esse tipo de cultivo.
Mesmo com uma produção baixa, o mercado de orgânicos no Brasil está crescendo. Segundo estimativas do Serviço Internacional do Departamento de Agricultura dos EUA, o setor teve um crescimento acumulado de 20% entre 1998 e 2000, quando movimentou US$ 150 milhões.
Em um ano, as vendas de orgânicos cresceram 30% no supermercado Pão de Açúcar. Segundo o Carrefour, o segmento cresceu mais de 50% no mesmo período. (MARIA BRANT)


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