São Paulo, sábado, 13 de outubro de 2001
 

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ASCENSÃO SOCIAL

Possibilidade de mudança de status é mais baixa; negros sofrem perdas cumulativas durante etapas da vida

Maioria dos filhos não terá vida melhor que a de seus pais

João Wainer/Folha Imagem
VALORES Funcionário da corretora Santander há cinco anos, Waldir da Silva, 39, trabalha no pregão da Bovespa; segundo a assessoria da Bolsa cerca de 10% dos corretores são negros


DA EQUIPE DE TRAINEES

A maioria dos pais negros não pode sonhar que seus filhos viverão melhor do que eles. Entre os pretos, 44% dos descendentes superarão a situação de seus pais. A taxa é de 46% para os pardos.
A taxa de ascensão social entre os brancos (53%) é 20% maior do que aquela encontrada entre os pretos e 15% maior do que entre os pardos.
A pesquisa foi feita por Nelson do Valle e Silva, 55, professor do Iuperj (Instituto de Pesquisas do Rio de Janeiro). Silva estuda as desigualdades raciais desde 1976 e é doutor em sociologia pela Universidade de Michigan.
O estudo realizado por ele, publicado em 2000 no livro "Tirando a Máscara", faz uma comparação entre os dados recolhidos pela Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 1970 e a de 1996. Segundo a pesquisa, os negros têm perdas cumulativas durante a vida devido a: origem social pior, menor acesso à escolaridade, maior evasão escolar e mais dificuldade em transformar o estudo adquirido em renda.
Silva dividiu os estratos ocupacionais em seis faixas, seguindo critérios de remuneração e qualificação exigida do profissional. O nível mais baixo é o dos trabalhadores rurais não-qualificados e o mais alto é composto por profissionais de nível superior e grandes proprietários.
Quando se analisa a elite, os negros saem perdendo: dentre aqueles cujo pai ocupava posição no estrato mais alto, 37% dos brancos conseguiram se manter na posição do pai, mas apenas 17% dos negros permaneceram no topo da escala.
No total da sociedade, a perda de status socioeconômico não apresenta diferenças significativas entre os três grupos de cor (brancos, pretos e pardos).
A imobilidade social também é maior entre a população afro-descendente: 43% dos negros continuam no mesmo estrato que seus pais, enquanto 33% dos brancos estão na mesma situação.

Discriminação
Silva parte de uma análise do "ciclo de vida socioeconômico dos indivíduos". Esse modelo leva em consideração diversas etapas da vida de uma pessoa, como condição de saúde, mortalidade, situação educacional, entrada no mercado de trabalho, escolha conjugal e ocupação atual.
Segundo o estudo, mesmo que negros e brancos tivessem a mesma oportunidade nos diversos ciclos da vida, ainda permaneceria uma diferença de renda em torno de 13% em prejuízo da população negra. Essa diferença poderia, de acordo com o pesquisador, ser atribuída ao preconceito racial.
O núcleo das desigualdades não estaria, segundo a interpretação de Silva, tanto no mercado de trabalho, mas na educação. Oferecer aos dois grupos a mesma quantidade de estudo não seria suficiente, porque a diferença na qualidade do ensino oferecido aos dois grupos continuará perpetuando a desigualdade de oportunidades. A educação seria, então, a melhor forma de equalizar as chances: "Nós temos que ter escolas públicas e de boa qualidade".

Empresas
A pequena presença de negros nos níveis superiores de ocupação no mercado de trabalho pode ser comprovada pela ausência de afro-descendentes nos postos de primeiro escalão das grandes empresas instaladas no país.
A Folha procurou saber quantos negros havia no topo da escala administrativa das maiores empresas do país em 21 setores diferentes. Em 35 empresas contatadas, não havia nenhum negro no primeiro escalão, segundo as assessorias de imprensa.
O primeiro escalão das grandes empresas geralmente é formado por um presidente e um corpo de diretores, cujo número pode variar entre cinco e 20 pessoas.
Dessas empresas, cinco são européias, o que poderia explicar a ausência de negros em cargos executivos. As assessorias de imprensa informaram que esses cargos são ocupados por pessoas do país de origem da empresa.
Essa ausência pode ter também outra explicação: quem responde à pergunta. Para Nelson do Valle e Silva, os resultados poderiam ser diferentes se os próprios executivos fossem entrevistados. O pesquisador ressalta que, segundo os dados do IBGE, dentre o 1% da população mais rica do país, 12% são negros.


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