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Vícios modernos
20/06/2004

Íntegra: Entrevista com Rodolfo Urribarri

Entrevista com Rodolfo Urribarri, psicólogo e psicanalista, professor de psicologia da Universidade de Buenos Aires

A que se deve a dificuldade de Maradona de parar com as drogas? E por que a cocaína foi a droga eleita de Diego?

Não posso falar exatamente do que acontece com ele porque não o conheço e nunca tive a oportunidade de examiná-lo clinicamente. O viciado consumado tem sérias dificuldades para deixar as drogas. Os que começam acham que podem deixá-las quando quiserem, até que descobrem que não é assim. Isso acontece com todas as drogas, legais ou não. Quando a droga acarreta dependência psicológica, o problema é que o dependente não agüenta não consumir, ele necessita do estado que a droga que consome lhe traz. O conceito de adição tem um certo tipo de componente, às vezes do tipo biológico-orgânico, ou seja, a necessidade de recorrer a algo, geralmente um fármaco, e não poder prescindir dele. Porque a esse fármaco atribuem-se certas condições que proporcionam o bem-estar. Quando se acostuma ao efeito, maiores devem ser as doses para obter o estado desejado. Adictos inveterados não podem prescindir disso, para eles é como deixar de viver [ficar sem drogas]. Por isso vivem transgredindo, escapando, roubando, fazendo tudo o que seja possível para voltar a consumir. Não sei se isso se aplica a Maradona, mas é muito provável.

Por que a cocaína?

Cada um escolhe a droga que melhor lhe serve. Cada pessoa busca o fármaco que lhe proporcione o estado de tranqüilidade que busca. Em alguns casos, como costuma ocorrer com pessoas famosas, atribui-se parte de seu êxito ao consumo da droga, e então torna-se duplamente difícil deixá-la.

Seria como um poder especial?

É o espinafre do Popeye. Observei em algumas pessoas bem-sucedidas, profissionalmente ou de outra forma, e que em parte devem este sucesso ao consumo de cocaína, acreditam que ela lhes confere um poder especial. Não falo sobre ele especialmente, mas dos dependentes.

Quem foi Maradona, quem é hoje e o que significa para a Argentina?

Ele se transformou numa figura mítica, como as presentes em qualquer sociedade. Transformaram-no num ídolo que transcendeu as fronteiras, de maneira que em países árabes, não se sabe quem é o Papa, mas se sabe quem é Maradona. É um sujeito que, com sua capacidade desportiva e habilidade pessoal, conseguiu transcender as fronteiras do mundo. Ontem conversei com um rapaz que dizia: "Maradona é o melhor jogador de futebol do mundo! Não, foi! Não, é, segue sendo!", ainda que seja um boneco, neste momento. Para o imaginário geral do torcedor de futebol, ainda é, ainda que não jogue há muito tempo, e que os seus últimos tempos tenham sido muito penosos. Ele teve para nós, possivelmente, uma importância maior do que a que teve Pelé, para o Brasil. Maradona despertou uma paixão tão vigorosa, não só aqui, mas também na Itália. Pergunte a um napolitano! Ainda o amam mais do que nós mesmos. O que despertou vai além de sua capacidade desportiva. Isso é algo que nenhum outro jogador de futebol conseguiu. Faz coisas que a outros lhes custariam a carreira.

Ele tem medo de perder o amor das pessoas?

Não acho que ele tema isso, porque as pessoas demonstram continuamente o amor que sentem por ele. E quando cai, as pessoas vão à porta do hospital com frases de incentivo, souvenires, rezam, dizem que siga em frente.

Não sei o que favoreceu sua dependência ou a manutenção dela, sua história se ocupará disso. Antes de conhecer a cocaína as pessoas já estavam a seu lado. E ainda que tenha problemas por isso, elas continuarão a seu lado. Há uma benevolência para com ele, que não haveria com nenhum outro.

Que se pode esperar dele?

Que melhore por si mesmo.

A internação, no caso dele, era necessária?

Sim, não tanto pelo vício, mas pelos efeitos colaterais que isso acarretou. Sobrepeso, cardiopatia. A internação é por um problema clínico. Dependências graves não se curam sem internação, quando se curam. O índice de recuperação por internações é baixo.

Maradona ainda pode chegar à decadência ou já é, indiscutivelmente, um mito?

Como se dizia de Evita, ele é "eterno na alma de seu povo". Será sempre o melhor jogador do mundo.

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