São Paulo, domingo, 16 de janeiro de 1994
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Proteger o patrimônio histórico é garantir o futuro

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Nestes primeiros dias do ano ganhei uma folhinha do Posto São Luis do Paraitinga que é verdadeiro exercício de cidadania, constitucionalmente correto. Não se espante: ao editar seu calendário, com uma vista antiga da pequena cidade que lhe dá o nome, situada entre Taubaté e Ubatuba, o auto-posto faz profissão de fé em favor da defesa da história e da arquitetura do município.
Oswaldo Cruz, o sanitarista, nasceu em São Luis. A cidade tem –conforme esclarece um anexo do calendário– "o maior número de prédios tombados pelo Condephaat e pelo Estado". Sua praça central é, especialmente, uma súmula de prédios do Brasil colônia e do Brasil império, num esforço de preservação também viabilizado pela consciência da cidadania.
A Constituição de 1988 foi a primeira a tratar da proteção do patrimônio histórico e ambiental da Nação. Foi além, ao dar armas ao cidadão interessado na proteção. Incluiu no rol dos seus direitos fundamentais a legitimidade para propor ação popular que vise a anular ato lesivo à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, como se lê do inciso 73 de seu artigo 5.º. O autor do processo nem sequer responderá por custas e honorários de advogado da parte contrária caso perca a ação, salvo hipótese de comprovada má-fé.
A Carta Magna não para aí. Tem inúmeros dispositivos sobre o tema. Distribuiu, no artigo 24, a competência da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar concorrentemente sobre florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição (inciso 6.º) e sobre proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico e paisagístico (inciso 7.º). Destacou, assim, a necessidade imperativa de que seu tratamento ultrapasse o nível apenas federal.
A responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico pode ser determinada, na forma de texto constitucional, pelos Estados. A sociedade deve estar atenta. Para tanto deve, de início, compreender que a preservação dos valores históricos e paisagísticos –ou arquitetônico, no caso de São Luís– é uma fonte de riqueza para todos, na medida em que promove a poderosa indústria do turismo. Além do aspecto econômico há a melhor qualidade da vida num ambiente agradável.
Mais que uma questão de economia e de preservação ambiental contemporânea, a preocupação com o patrimônio cultural chama atenção para nossa transitoriedade enquanto indivíduos.
Transitoriedade a ser contraposta à permanência do patrimônio cultural como garantia das gerações que virão, a dos nossos netos e dos netos de nossos netos. O futuro deles será melhor se nós, no presente, formos fiéis aos preceitos constitucionais mencionados.
Na proclamação que anexou ao calendário, o posto São Luis do Paraitinga diz o essencial em termos de cidadania, quando afirma seu objetivo de "contribuir para o fortalecimento de uma consciência memorial arquitetônica" e para preservar "nossa riqueza histórica de tão auspiciosa memória". Ninguém constrói o futuro sem preservar o passado.

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