São Paulo, quinta-feira, 27 de janeiro de 1994
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Caminho de ferro-eixo da riqueza

PAULO AUGUSTO VIVACQUA

Caminho de ferro-eixo para a riqueza
Vivemos hoje, no Espírito Santo, experiência inédita, que nos permite tocar para a frente, em conjunto com outros seis Estados do Brasil, um projeto de desenvolvimento econômico sustentável. O Corredor de Exportação Centroleste é, sem dúvida, um esforço de integração regional de caráter combinatório, complementar.
Este esforço nos inspira, entretanto, a reconsiderar e repensar a infra-estrutura de transportes do país.
Todos sabemos que a opção das rodovias serviu para alavancar, na década de 50, o desenvolvimento industrial do Brasil. Hoje, porém, estamos pagando caro por termos abandonado nossos caminhos de ferro.
O velho trem, sem dúvida, é a solução mais barata, eficaz e moderna que o país tem diante de si para retomar a rota da riqueza da qual se desviou.
O deafio exige, porém, uma mudança de mentalidade. Precisamos compreender que nem sempre as solução mais adequadas estão em engenharias complexas ou obras sofisticadas. Enxergar o óbvio, muitas vezes, é mais difícil. De outra forma, que estejamos amarrados a um sistema de transportes tão oneroso?
Qualquer um que se deter a acompanhar o caminho que frutas, verduras, leguminosas e grãos percorrem para chegar desde as comunidades agrícolas até os centros urbanos descobrirá que o principal gargalo é a ineficiente malha de transporte. O que, lá no ponto final, contribui para multiplicar a miséria por todo o território nacional.
O Brasil é hoje o país que mais gasta para escoar suas safras. O frete, aqui, custa quase duas vezes mais que nos países desenolvidos. Ainda que se argumente as dificuldades impostas por nossas dimensões continentais, nada justifica que tão pouco tenha sido feito em 493 anos de história. Ou que o que se fez tenha sido desperdiçado pelo estrabismo do Poder público, que sucumbiu ao lobby das rodovias e simplesmente substituiu os trilhos pelo asfalto. Ora, ferrovias e rodovias se complementam.
O trem não depende de vultosos investimentos, não polui, nem desperdiça divisas com a importação de petróleo, seja para produção de asfalto, seja para combustível.
Só pelo desempenho do Corredor, uma ferrovia Centro-Leste já se justifica. Ele hoje responde por aumento de 400% das exportações de grãos de farelo de soja e as projeções indicam que o escoamento para o mercado externo tenha atingido 1,5 milhão de toneladas em 93, contra as 300 toneladas de 1992. Conseguimos reduzir os custos de frete, do Cerrado ao porão do navio, incluída a taxa de embarque, de US$ 70 para US$ 27 a tonelada do grão.
O estímulo à indústria ferroviária deve ser compreendido como uma afirmação nacional e regional. Temos que dar aproveitamento aos US$ 50 bilhões que o Brasil investiu na construção de 22 mil quilômetros de linhas férreas, estações e na aquisição de vagões e locomotivas. Um patrimônio imenso que o poder público tem por obrigação tornar útil.
A experiência do Corredor Centro-Leste abre ao governo a oportunidade de fazer sem investir. Conectando partes de um todo –empresas de ferrovia, porto e investidores privados– construímos um sistema que nada custou aos cofres públicos. Aproveitamos a capacidade ociosa existente e mobilizamos capital privado. Cerca de US$ 80 milhões já foram postos em armazéns, silos, terminais. Basta, portanto, ao governo, exercer seu poder de mobilização.
O Brasil é um dos maiores do mundo em recursos naturais, seja pela extensão de terras, seja pelo potencial hidrelétrico e mineral, associados ao clima apropriado, que nos preserva do rigor do inverno e da esterilidade dos desertos.
Outro grande recurso é a população. A integração do Brasil por ferrovias permitirá casar a força de trabalho do país à sua gigantesca base física. Movendo a população para o interior, estaremos tomando posse real de nossos recursos naturais –a posse econômica.
Conferir valor ao bem agrícola e ao bem mineral, gerando com eles receita maior e criando maiores oportunidades de trabalho, no momento em que o país inteiro se dá conta de que é preciso acabar com a fome e a miséria, é a saída. Afinal, emprego é parte desta cruzada e, só assim, emitiremos à cada um dos brasileiros carteira de cidadão.

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