São Paulo, segunda-feira, 31 de janeiro de 1994
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Tintim aventura-se na telinha da Cultura

EDUARDO SIMANTOB
DA REDAÇÃO

Programa: As Aventuras de Tintim
Onde: TV Cultura
Quando: de segunda a sexta, às 19h30
Estréia: hoje

A TV Cultura começa a exibir hoje, às 19h30, a série canadense "As Aventuras de Tintim", baseada nas histórias criadas pelo cartunista belga Hergé, pseudônimo de Georges Remi (1907-1983). Criado em 1929, Tintim é o personagem principal de uma das mais importantes séries de quadrinhos da Europa, com 120 milhões de álbuns vendidos no mundo todo, em 45 idiomas.
Tintim é o alter ego de seu criador, o repórter aventureiro e audacioso que Hergé não conseguiu ser. Acompanhado de seu fiel cachorro Milu e de seu amigo, o capitão Archibald Haddock, Tintim viaja o mundo inteiro seguindo sua curiosidade e buscando a verdade e a justiça. Já foi acusado de reacionário e colonialista, assim como Hergé de colaboracionista durante a Segunda Guerra.
Essas acusações têm suas razões, em parte. A primeira aventura de Tintim, "Tintim no País dos Sovietes", destaca-se pelo anticomunismo maroto, caricaturando os soviéticos como bobões autoritários. "Tintim na Africa", também do início dos anos 30, expressa uma postura que, guardadas as devidas proporções, não destoa muito dos personagens do livro "No Coração das Trevas", de Joseph Conrad.
Até então, Hergé não tinha grandes preocupações com a exatidão dos fatos históricos, nem muito rigor com as formas. Em 1934, ao conhecer um estudante de Belas Artes chinês, Tchang Tchong Jen (que virou personagem em algumas histórias), Hergé começou a aprimorar as aventuras de Tintim, não só em relação aos desenhos como também quanto à estrutura narrativa.
Vêm daí os álbuns mais cultuados, "Os Charutos do Faraó" e "O Loto Azul". Pode se dizer que, a partir de então, as aventuras de Tintim transformaram-se em uma literatura infanto-juvenil hardcore. O personagem envolve-se em tramas políticas, combate uma rede internacional de tráfico de ópio, é preso inúmeras vezes, condenado à morte, dopado, mas sempre triunfa.
Seus companheiros também não podem ser chamados de heróis, no sentido clássico do termo. O capitão Haddock é um inveterado alcoólatra, o professor Girassol, um típico cientista aloprado e alienado da realidade, e os detetives Dupond e Dupont, da Interpol, parecem saídos dos pastelões do cinema mudo.
Antes de Tintim, as tiras européias ainda encontravam-se na idade da pedra. Hergé acabou influenciando diversos desenhistas, criando o que se denominou a "escola belga" de quadrinhos. Mas a consagração definitiva só se deu durante os anos 50. Antes disso, Hergé não teve pudores de utilizar a figura de Tintim em comerciais, nem de trabalhar no jornal colaboracionista "Le Soir", razão pela qual ficou dois anos desempregado depois da Segunda Guerra.
Na ocasião da morte de Hergé, o jornal francês "Libération" reproduzia em sua primeira página um quadrinho em que Milu chorava a morte de Tintim. Naquele dia, o jornal não publicou fotos, substituindo-as por tiras do herói.
A série que a TV Cultura exibe a partir de hoje foi produzida em 1992 pela Ellipse Programme e Nevlana, do Canadá. As animações são baseadas nas próprias histórias imortalizadas nos quadrinhos, recriando-as fielmente. É certamente um bom programa para crianças "de 7 a 77 anos", que ainda acreditam no prazer da aventura e da descoberta.

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