São Paulo, domingo, 2 de outubro de 1994
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Três meses de real

ITAMAR FRANCO

"Nada se deixou de fazer em função das eleições; nada se fará depois apenas porque as eleições terão passado."
O real faz três meses. Os brasileiros puderam testemunhar como se foi cumprindo a promessa da queda da inflação e como se foi consolidando a estabilidade. Como um sonho feito real, estamos vendo o Brasil recuperar o otimismo e alimentar uma pespectiva positiva à frente. Quaisquer que sejam os resultados das eleições, nos diversos níveis, os candidatos vitoriosos terão por tarefa não mais consertar uma economia em crise, mas sim consolidar a estabilidade e ampliar os benefícios que ela já vem trazendo, sobretudo aos mais pobres, aos que vivem de salário.
A inflação baixou de mais de 45% ao mês, em junho, para cerca de 1,5% ao mês, em setembro. O câmbio ficou relativamente estável, até mesmo com uma valorização do real, que reflete a confiança na economia brasileira. As tarifas públicas permaneceram imutáveis. No seu dia-a-dia, o brasileiro percebe claramente o que é a estabilidade. O consumo popular cresceu, mas os preços têm-se mantido estáveis –vários até baixaram, como ocorreu com a cesta básica do Dieese/Procon-SP, que já diminuiu 8,81% desde 1º de julho. Não houve desabastecimento, nem desemprego, nem pressões que não pudessem ser tratadas pela negociação e pelo diálogo. A maior abertura da economia brasileira ampliou a oferta de produtos externos e o desafio da competitividade resultou em benefício do consumidor. Há uma consciência maior da população a respeito do valor do dinheiro, da relatividade dos preços e da vantagem que é conhecer e comparar preços, juros e a qualidade dos produtos. O Plano Real tem sido bom para a população e para a economia. Perto de 80% de aprovação popular nas pesquisas celebram esse fato.
Sente-se no país um clima novo, de resgate da autoconfiança e de expectativas positivas. Essas expectativas estão amparadas em dados concretos da economia e não apenas em expressões de vontade política ou em promessas vinculadas ao processo eleitoral que está em curso. Ao contrário, a estabilidade contribuiu para aprimorar o debate político e passou a ser uma referência fundamental no processo de renovação não apenas da Presidência da República, mas dos governos estaduais, de dois terços do Senado Federal, da totalidade da Câmara de Deputados e das Assembléias Legislativas estaduais.
Os resultados que estamos obtendo nestes três meses de real, somados a algumas realizações anteriores, como a solução do problema da dívida e a trabalhosa obtenção do equilíbrio orçamentário, mudaram para positivo o sinal com que o Brasil figurava na agenda econômica e financeira internacional e na mentalidade dos próprios brasileiros. Essa mudança é tanto mais significativa quanto se sabe que ela foi conseguida graças, fundamentalmente, aos esforços que o próprio país fez, em um contexto de ceticismo, quando não de descrença, quanto à capacidade de iniciativa do governo na economia. Muitos governos estrangeiros e organismos internacionais, assim como boa parte das empresas, associações e partido políticos dentro do Brasil foram inicialmente céticos e permaneceram como espectadores ou críticos do processo, provavelmente influenciados pelo elevado número de experiências anteriores de estabilização que fracassaram em seus objetivos, quando não agravaram a situação econômica do país.
Compreende-se que tenha sido assim. Afinal, o Programa de Estabilização foi concebido e implementado a menos de um ano e meio do término de um governo. Até então nossos esforços se haviam concentrado em assegurar a estabilidade democrática, a reconquista dos valores da ética na administração do Estado e o pleno funcionamento das instituições políticas e jurídicas após a experiência traumática de um impeachment presidencial. Eu me orgulho de poder dizer que, além de ter assegurado uma transição política tranquila, que desembocará nas eleições deste dia 3 de outubro, o meu governo deu um passo decisivo no campo econômico, recuperando a capacidade de iniciativa do Estado brasileiro e gerando fatos de grande impacto tanto no âmbito interno quanto no setor externo da economia brasileira.
Três meses com o real ensinaram muitas lições, que o país poderá aplicar no seu futuro próximo. Assinalo apenas algumas delas, que me parecem mais significativas. A sensibilidade do nosso povo, sem cuja participação muitas vezes apaixonada o Plano Real teria tido dificuldades para vencer. O valor da estabilidade, o apelo que ela tem junto ao povo, junto aos mais humildes, aos que não têm como se proteger da inflação. Ficou provado que o combate à inflação não é uma causa impopular e uma aspiração das elites. O valor da ousadia, do arrojo, da iniciativa: decidimos estabilizar a economia quando muitos pensavam que não havia nada mais a fazer a não ser esperar as eleições e a troca de governo. O povo brasileiro não gosta de passividade, de derrotismo; ele responde prontamente aos que trazem propostas de ação, e o Plano Real é uma proposta concreta e uma realização.
Por tudo isso, pelo que estes três meses de real nos ensinaram sobre o valor da estabilidade e o apego que o povo tem a ela, convém reafirmar que o Plano está caminhando bem e que não se contemplam mudanças em sua estrutura, em seus componentes fundamentais e em sua orientação geral. Os ajustes e aperfeiçoamentos necessários continuarão, do mesmo jeito que vêm sendo feitos, dentro do espírito de transparência e diálogo que marcou este Plano desde o início. Nada se deixou de fazer em função das eleições; nada se fará depois apenas porque as eleições terão passado.

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