São Paulo, domingo, 2 de outubro de 1994
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Reservas e inflação contrastam com 89

GABRIEL J. DE CARVALHO

GABRIEL J. DE CARVALHO; JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
DA REDAÇÃO

JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
O mercado financeiro chegou a mais uma eleição presidencial sem o nervosismo de cinco anos atrás.
As taxas de inflação beiram zero por cento e o dólar paralelo, termômetro de crise na eleição de 1989, hoje só consegue atrair turistas com as passagens já na mão.
Às vésperas da eleição de 15 de novembro de 89, quando Collor e Lula ganharam o direito à disputa final em 17 de dezembro, a distância do dólar paralelo em relação ao comercial superava 100%. Um mês depois avançava para 140%.
O ritmo dos preços saltava dez pontos a cada mês e alimentava a expectativa de uma hiperinflação cada vez mais próxima.
Em 89, as reservas internacionais (moeda forte) do país correspondiam a poucos meses de importação. Agora, mais de US$ 40 bilhões sustentariam alguns anos.
O Brasil estava fora da rota dos investidores estrangeiros em 89. Desta vez o esforço do governo é para inibir crescentes ingressos.
A dívida federal em títulos fora do Banco Central equivalia a cerca de 15% do PIB (Produto Interno Bruto) em 89. Hoje, a 11,8%.
A dívida atual, porém, em boa medida tem sua contrapartida nas próprias reservas externas. Como cada dólar vira moeda nacional ao entrar no país, o governo emite títulos para enxugar a tão (e mal) falada expansão monetária.
A eventual vitória de Lula também não assusta o mercado como antes. O ex-presidente da Fiesp Mario Amato não se arriscaria a repetir que 800 mil empresários fugiriam para o exterior. Mudou o país, mudou o mundo.
Acabou a "guerra fria" e capitais buscam os mercados emergentes. A Libor, parâmetro de juros internacionais, era de 8% e atualmente gira em torno de 5% ao ano.
Para o ex-ministro Mailson da Nóbrega, que manejava o timão da economia no final do governo Sarney, os cenários são mesmo radicalmente distintos.
"Em 89, o governo era o saco de pancadas da eleição presidencial. Nenhum candidato o apoiava, o que dificultava o trabalho da equipe econômica. Hoje, a política econômica do governo é a alavanca de uma candidatura."
Ele completa: "Em 89, qualquer que fosse o resultado da eleição, a expectativa era de descontinuidade, de ruptura. Hoje, a expectativa é de continuidade de um plano bem-sucedido."
O cenário econômico de 89 é resumido assim pelo ex-ministro:
1) acabava de fracassar mais um plano, o Verão (janeiro de 1989), chamado de "tentativa para ganhar tempo via congelamento";
2) o governo perdera a batalha da inflação e lutava para impedir, via política de juros altos e "uma ação sobre as expectativas", o colapso hiperinflacionário;
3) o país acabara de aprovar, no final de 88, a chamada "Constituição Cidadã";
4) o Congresso aprovara proposta do deputado Paulo Paim (PT-RS) de reajustar mensalmente o salário mínimo em 3% acima da inflação. O projeto foi vetado pelo presidente e seu veto foi derrubado pelo Congresso;
5) o Congresso também rejeitou proposta de privatização.
"Nós tornamos público que a intenção do governo era entregar o país para o sucessor com a economia funcionando. Tivemos dúvidas sérias se esta meta seria atingida", diz Mailson.
Na opinião do ex-ministro, houve um amadurecimento da sociedade: "Hoje há consenso de que qualquer política de combate à inflação passa pela desindexação, pelo ajuste fiscal e pela reforma da Constituição."
Os contrastes macroeconômicos entre 89 e 94 têm seu lado mais negativo no desemprego.
Na Grande São Paulo, por exemplo, a taxa está em 14,4%, o dobro de cinco anos atrás. Os desempregados somam 1,1 milhão, contra 496 mil naquela época.
Fora manter a inflação com rédea curta, reverter este quadro social parece ser o maior desafio do próximo presidente. Crescer à base de déficit fiscal e emissões de moeda, como antes, é fórmula esgotada.

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